sábado, 7 de maio de 2011

ACORDA CORDEL EM GOIANIA


'Patativa não era analfabeto'

Edson Wander · Goiânia, GO (16/1/2007 )
Entrevista de Arievaldo Viana no Site OVERMUNDO 
A assertiva acima é do cordelista Arievaldo Viana, responsável pelo projeto Acorda Cordel na Sala de Aula. Publico abaixo a matéria que fiz sobre o projeto e a conversa que tivemos por email. Já me agendava para trazer esse papo aqui pro Overmundo e fui instigado a apressar a postagem pela entrevista que o Pedro Rocha fez com o pesquisador Gilmar de Carvalho (procurar por "O range-range inquieto...). Aliás, gostaria de ver o que Gilmar diria dessa informação do Arievaldo sobre o analfabetismo de Patativa do Assaré, já que ele escreveu sobre o poeta. Os demais colegas overmundanos podem comentar também sobre a alimentação que se fez na mídia sobre esse "incultismo" de Patativa. Puxei para essa história do Patativa pelo inusitado da coisa (ao menos pra mim), mas o projeto de resgate do cordel capitaneado pelo Arievaldo é o grande lance, tanto que deixei a questão do Patativa no fim da fila da entrevista. O Arievaldo me mandou depois uma outra entrevista muito mais interessante que ele deu a uma pesquisadora universitária que não reproduzo por falta de autorização, que nem quis pedir, aliás. Espero que ele ou ela se animem a trazê-la aqui. Deixei de propósito as respostas dele como me mandou na mensagem, incluindo as diferentes letras em maiúsculas e minúsculas, artifício que eu não pude fazer no jornal. Viva a liberdade editorial Overmundana !
Cordel de classe
Nova geração de poetas nordestinos revive a literatura de cordel
e resgata a beleza e o poder alfabetizador dessa arte



Forma literária secular que se ramificou por outras manifestações artísticas no Brasil (como a xilogravura e o repente), o cordel já foi importante instrumento de alfabetização, transmissão de conhecimentos e incentivo à leitura, especialmente no Nordeteste brasileiro. O auge do cordelismo se deu entre os anos de 1940 e 1950. Quase se extinguiu como cultura de massa, mas está ganhando novo fôlego pelo trabalho de uma nova geração de poetas e chegando às salas de aula pelo projeto Acorda Cordel na Sala de Aula, capitaneado pelo poeta, radialista, ilustrador e publicitário cearense Arievaldo Viana, 39 anos.
Como Arievaldo Viana, há hoje poetas escrevendo novos cordéis – livrinhos de formato e linguagem originais – e reeditando obras de cordelistas importantes do passado, como os paraibanos João Martins de Athayde (1887-1959) e Leandro Gomes de Barros (1865-1918). Esse movimento de revitalização do cordel data do fim dos anos 90, com o surgimento de editoras importantes do gênero como Tupynanquim (de Fortaleza), Coqueiro (Recife) e Queima-Bucha (Mossoró). Em Campina Grande (PB), o cordelista Manoel Monteiro conseguiu implantar um arrojado programa editorial de cordel com apoio dos poderes públicos locais.
O histórico do cordel levantado por Arievaldo no livro Acorda Cordel na Sala de Aula destaca o trabalho de poetas-editores como Pedro Costa (no Piauí), o mineiro Téo Azevedo (do Norte de Minas Gerais) e nordestinos radicados em São Paulo e Rio, como Mestre Azulão, Apolônio Alves dos Santos e Gonçalo Ferreira, que revive os livrinhos em bancas na feira de São Cristóvão, no Rio de Janeiro. Já adotado em escolas de várias cidades, o projeto Acorda Cordel na Sala da Aula contempla um livro homônimo que funciona como um guia do cordel para professores, uma caixa com 12 livrinhos de diferentes autores e um CD com músicas defendidas por repentistas como Geraldo Amâncio, Zé Maria de Fortaleza, Judivan Macedo e Mestre Azulão, além do próprio Arievaldo.

O livro-guia traz as origens e o desenvolvimento do cordelismo no país, as técnicas e modalidades e sugestões de exercícios para se trabalhar com alunos. É ferramenta paradidática da alfabetização ao ensino médio, garante Arievaldo, alfabetizado pela avó com os livrinhos. Em que pese a história da poesia popular ter exemplos de poetas analfabetos ou semi-analfabetos que ficaram famosos por explorarem ou apresentarem essa condição em seus poemas, Arievaldo Viana se apressa em dizer que o projeto Acorda Cordel na Sala de Aula prima por ensinar o cordel de acordo com a norma culta da língua portuguesa.
“Desde Leandro Gomes que os cordelistas escrevem e defendem a correção da escrita. E há uma diferença entre o cordelismo e a poesia matuta, os próprios poetas matutos não gostavam de serem tratados como cordelistas”, diz, em referência a Zé da Luz (1904-1965) e Patativa do Assaré (1909-2002).
Aquisições do kit do projeto Acorda Cordel na Sala de Aula com o autor pelo e-mail acordacordel@ig.com.br  pelo telefone (85) 9909-1745.

Geraldo Gonçalves (filho de Patativa), Kydelmir Dantas,
Arievaldo Viana e o Senador Inácio Arruda


A ENTREVISTA

1 – Li sobre o trabalho da editora Tupynanquim e fiquei curioso por saber se se produz tanto cordel hoje quanto no auge dessa arte, nas décadas de 40 e 50, como você aponta do livro-roteiro do projeto Acorda Cordel na Sala de Aula.

ARIEVALDO - Na década de 1990 o cordel esteve ameaçado de extinção e houve mesmo quem fosse aos jornais e tv's anunciar a sua morte. Li matérias de professores universitários que pesquisam a cultura popular dizendo que só havia sobrevivdo o folheto circunstancial, aquele cordelzinho jornalístico de oito páginas. Eu, particularmente, não gosto de produzir coisas dessa natureza... os únicos cordeis circunstanciais que eu produzi foram sobre a QUEDA DAS TORRES GÊMEAS e a MORTE DO PAPA JOÃO PAULO II, que na verdade é uma biografia de um vulto que eu já admirava... Não foi com interesse oportunista que eu produzi. Tenho mais de oitenta folhetos já publicados, muitos de 32 páginas, que o tradicional "romance". Quando comecei a publicar meus folhetos, no final da década de 90, abracei essa causa com o intuito de revitalizar o cordel e estimulei outras pessoas a produzir e publicar. O poeta MANOEL MONTEIRO de Campina Grande. estava editando seus trabalhos em pequenas tiragens feitas em XEROX... Depois da minha injeção de ânimo voltou a publicar em gráfica, em grandes tiragens de 3 a 5 mil exemplares e aos poucos a gente foi montando um sistema de distribuição para todo o Brasil. Hoje eu vendo e permuto folhetos com poetas de São Paulo (Marco Haurélio), Rio de Janeiro (Mestre Azulão, Marcus Lucenna e Gonçalo Ferreira - o pessoal da ABLC - Academia Brasileira de Liteatura de Corde), da Paraíba (Manoel Monteiro, Astier Basílio), do Rio Grande do Norte (Antonio Francisco e Crispiniano Neto), de Pernambuco (Costa Leite e Marcelo Soares), da Bahia (Bule-Bule), enfim... o cordel repentinamente renasceu em todo buraco. Como diz o poeta Manoel Monteiro, a poesia popular é igual a saúva... não tem quem consiga matar. Hoje, editoras como a TUPYNANQUIM e a QUEIMA-BUCHA são responsáveis pelo lançamento de quase mil títulos, em dezenas de tiragens... Mesmo assim, o cordel ainda não atingiu a mesma intensidade do tempo de João Martins de Athayde, quase se faziam tiragens de até 50 mil exemplares de clássicos como PROEZAS DE JOÃO GRILO e PAVÃO MISTERIOSO.

2 – Na sua opinião, por que a literatura de cordel em prosa não floresceu no Brasil como na Europa ?

Justamente devido à musicalidade do povo brasileiro... Um povo que tem a melodia no sangue e já fala cantando e anda gingando. É natural essa clara preferência pela poesia rimada e metrificada. Mas existem alguns casos de cordel em prosa, só que muito raros aqui no Brasil. Numa coleção de quase quatro mil títulos que eu tenho, existem apenas uns quatro ou cinco textos em prosa. O resto é feito em sextilhas, setilhas e martelos.

3 – São vários exemplos de uso do cordel como fonte de músicas conhecidas. O que move essa proximidade entre cordelistas e músicos? Apenas a poesia como fonte de letra para as canções explica a relação?

O CANTADOR e o CORDELISTA são essencialmente musicais. A questão da métrica está sempre presente e o ritmo de leitura do cordel em voz alta é pura música... Veja o caso de JACKSON DO PANDEIRO... o único tipo de literatura que ele consumiu a vida toda foi o CORDEL. Se você analisar a obra de Jackson, de Luiz Gonzaga, de João do Vale, de Gordurinha e da nova geração de compositores nordestinos, vai ver que todos tiveram influência da cantoria e do cordel. E por que isso? A poesia popular oral foi que deu origem as cantigas, as canções de eito (de trabalho) e está presente no mundo todo... Na Península Ibérica, no México, na Argentina. Só que, ao chegar no Nordeste, não foi impressa como simples "folhas corridas" ou "pliegos sueltos". Lá no México era uma folha de papel ofício dobrada ao meio e ilustrada com uma gravura do grande José Guadalupe Posada, os temas eram muito parecidos com os nossos. A história de bandidos famosos como EL TIGRE DE SANTA JÚLIA, ou as escaramuças de Emiliano Zapatta correspondem aos feitos de Antonio Silvino, Conselheiro, Lampião, Padre Cícero e outros personagens brasileiros. O que diferencia o nosso cordel é o formato. Foi Leandro Gomes de Barros quem primeiro adotou o sistema de dobra a folha de ofício em quatro partes orginando com isso o formato 16x11cm, que sobrevive até hoje. Os folhetos são sempre múltiplos de oito páginas, oito, dezesseis, vinte e quatro, trinta e duas, quarenta e quarenta oito páginas. Podem vir em um, dois ou três volumes, como é o caso de clássicos como ROMANCE DE UM SENTENCIADO, que é uma adaptação do CONDE DE MONTE CRISTO, do Alexandre Dumas. Os trovadores franceses, espanhóis e portugueses narravam os feitos de Carlos Magno e os Doze Pares de França... Donzela Teodora, Jean de Calais, João Grilo, Pedro Malzartes (ou Pedro de Urdemales). Esses temas foram a base do nosso cordel, juntamente com as gestas do Ciclo do Gado (Boi Espácio, Rabicho da Geralda, Boi Vermelhinho, Boi Mandingueiro, Vaca do Burel, etc). Surgiram inicialmente em quadras e em forma de ABCs. Vieram também os ABC's de Jesuíno Brilhante, de Lucas da Feira, do Cabeleira e outros bandidos do primeiro ciclo do cangaço. Essas histórias tinham uma melodia que foram reaproveitadas posteriormente por muitos compositores. Daí que um cara como Zé Ramalho, Ednardo ou Alceu Valença nada mais são que "violeiros eletrificados" ou trovadores eletrônicos, como diz o Belchior.

4 – O hip hop é um complexo de manifestações artísticas norte-americanas que junta canto, dança e grafite. Há paralelo possível entre o hip hop e as técnicas do cordelismo, também uma arte mista que se vale da rima, da xilogravura e eventualmente de músicos (pandeiristas, violeiros)? Inventamos muito antes deles essa tríade artística? Dá para afirmar isso?


Olha, Jackson do Pandeiro foi um dos primeiros caras a fazer uma coisa muito parecida com o RAP. O nosso Coco de Embolada tem o mesmo fraseado melódico. É difícil saber quem copiou quem... Isso vem da raiz africana e está presente em todos os povos onde há influência da cultura negra. O cantor de funk e de "rap" ainda faz uma coisa muito primitiva, com métrica quebrada e rimas forçadas. Uns garotos de uma cidade do interior do Ceará, que já faziam "rap", participaram de umas oficinas que fiz e depois que tiveram noções de métrica, rima e oração (regras básicas da Literatura de Cordel) admitiram que o trabalho deles iria evoluir muito mais depois que tiveram essa influência. A poesia popular nordestina tem muitas ramificações: A CANTORIA, O CORDEL, O ABOIO, O COCO DE EMBOLADA, A POESIA MATUTA e a LITERATURA DE CORDEL propriamente dita, que é a poesia popular impressa. Essa coisa da XILOGRAVURA nem sempre esteve presente. Leandro Gomes de Barros não usava, nem João Martins de Athayde, que foi o maior editor de cordel nas décadas de 20, 30 e 40 do século XX. Editores de menor poder aquisitivo, que não podiam pagar um clichê ou uma zincogravura, foram os primeiros a utilizarem esse recurso, a fazer o casamento do cordel com a xilo. Lógico que o resulto foi enriquecedor, porque une duas forma manifestações artísticas diferentes - a poesia e a gravura. Gabriel O Pensador me surpreendeu ao regravar a música A MULHER QUE VIROU HOMEM, de Jackson do Pandeiro. Além de reforçar essa batida de rap, ainda acrescentou algumas estrofes que não existiam no original e que não ficaram nada a dever à obra de Jackson. Eu geralmente levo essas músicas para as minhas oficinas e as pessoas ficam deslumbradas ao saber disso. Até Raul Seixas fez cordel - As aventuras de Raul Seixas na Cidade de Thor e Os Números são duas músicas onde a estrutura do cordel está presente. Portanto, a contribuição da poesia popular está presente também no ROCK, no xaxado, no baião e, se duvidar, até na fina flor da MPB. Veja por exemplo as músicas "PARATODOS" e "A VIOLEIRA" de Chico Buarque... são pura cantoria.

5 – Fiquei curioso com as informações que você diz ter sobre a erudição de Patativa do Assaré. Fale um pouco mais sobre. Porque isso não foi tão difundido? Ele não quis? Alimentava esse “mito” ou haveria outras razões?

Os primeiros folhetos de PATATIVA eram em linguagem convencional... são dessa safra ALADIM E A LÂMPADA MARAVILHOSA, ABILIO E SEU CACHORRO JUPI e outros. Paralamente ele também fazia sonetos e poemas matutos. Em dado momento ele percebeu que seus poemas matutos tinham melhor aceitação, sobretudo depois que LUIZ GONZAGA gravou a TRISTE PARTIDA. Então ele optou pela poesia matuta, seguindo a escola de CATULO DA PAIXÃO CEARENSE e ZÉ DA LUZ. Foi uma opção. Mas ele nunca negou que tinha influências de Castro Alves, Gonçalves Dias, Camões e outros poetas eruditos, que sempre leu com frequência. Criou-se um mito em torno do Patativa "analfabeto" que não é verdadeiro, embora ele fosse um camponês e convivesse com pessoas desletradas. Talvez dessa convivência é que tenha surgido esse toque de autenticidade na linguagem que ele escolheu para se manifestar artisticamente.

Obrigado pela entrevista.

Esta matéria de EDSON WANDER foi publicada também no jornal O POPULAR, de Goiania-GO,
Caderno Magazine, edição de 4 de dezembro de 2006.

Geraldo Gonçalves, Arievaldo Viana e Chico Pedrosa

70 ANOS DO MEU PAI

Evaldo e Hathane, foto de Francisco Karam, feita
no final da década de 1980

PARABÉNS, EVALDO LIMA

Hoje o autor dos meus dias
Completa setenta anos
Vida de sonhos e planos
Bonanças e tropelias
Escutando cantorias
Pois é discípulo da rima...
E para entrar nesse clima
Juntei uns quatro vinténs
E vou cantar parabéns
Para o bardo EVALDO LIMA.

Nasceu na Cacimba Nova
Lá no Quixeramobim
Do começo até o fim
Faz o bem e tira a prova
Bandeira que se renova
Estandarte do cordel
Vai cumprindo seu papel
E não gosta de mentira
É filho de dona Alzira
E do vovô Manoel.

Com Hathane é casado
Sertaneja carinhosa
Que inspira a sua glosa
E lhe trata com cuidado
Toda vida foi amado
Casaram em sessenta e seis
Por isso digo a vocês
Dos filhos sou o primeiro
Tem mais cinco no roteiro.
Com a Vandinha, são seis!

Parabéns Evaldo Lima
Meu verso é de gratidão
De todo meu coração
Desse filho que lhe estima
Que o Pai do Céu, lá de cima
Prolongue mais sua vida
Abençoe a sua lida
E quando um dia o chamar
Queira por bem lhe abrigar
Ao lado da mãe querida.

07 de maio de 2011

sexta-feira, 6 de maio de 2011

ARQUIVO DO CORDEL

ACORDA CORDEL NA REVISTA BRAVO!
NA SALA DE AULA
CARTILHA COM RIMA


O cordel saiu das praças e entrou nas salas de aula para levar cultura e educação aos alunos
Shirley Paradiso
Revista Bravo! - 10/2009

A literatura de cordel surgiu na metade do século 19, no Nordeste, para relatar ao sertanejo iletrado os mitos da cultura local e de fora, de forma épica, cantante e fácil de decorar por quem não sabia ler. Os poemas eram publicados em folhetos e, normalmente, ilustrados com xilogravura. Os cordelistas recitavam esses versos de forma melodiosa e cadenciada, acompanhados de viola, como também faziam leituras ou declamações muito empolgadas e animadas para conquistar os possíveis compradores.

Hoje, a literatura de cordel saiu das ruas, passou pelos livros e chegou às escolas cearenses por meio do projeto Acorda Cordel, idealizado pelo cordelista Arievaldo Viana. “Fui alfabetizado pela literatura de cordel, em 1973. Os folhetos eram as únicas leituras disponíveis. Primeiro, decorava os versos lidos por minha avó. Depois, ela foi me ensinando a identificar as letras e a formar palavras”, disse o poeta na época do lançamento do projeto, que tem como carro-chefe um livro didático de sua própria autoria. O “kit educação” conta ainda com uma coleção de 12 folhetos, composta por clássicos do gênero como O Justiceiro do Norte (de Rouxinol do Rinaré) e Epopeia do Boi Corisco (de José Vidal dos Santos).

Utilizar a poesia popular como meio de instrução sempre foi prática comum nas zonas rurais do Ceará, desde que o gênero despontou, e não é nenhuma novidade. As crianças da Grécia antiga já percorreram esse caminho, como assinalou o historiador cearense Gustavo Barroso em sua obra Ao Som da Viola (1921): “O ensino começava pela poesia, por ser o meio mais fácil de guardar na memória, nessa época em que livro era raro... Assim pôde o povo grego conservar, carinhosamente, de cor, os admiráveis cantos de seus rapsodos”. Hoje, os livros deixaram de ser raridade, mas ainda são caros e inacessíveis. Ao contrário do cordel, a que se tem acesso fácil e é cultuado através dos tempos como a verdadeira e autêntica literatura nordestina, o livro de bolso do povo da região.

A literatura de cordel surgiu na metade do século 19, no Nordeste, para relatar ao sertanejo iletrado os mitos da cultura local e de fora, de forma épica, cantante e fácil de decorar por quem não sabia ler. Os poemas eram publicados em folhetos e, normalmente, ilustrados com xilogravura. Os cordelistas recitavam esses versos de forma melodiosa e cadenciada, acompanhados de viola, como também faziam leituras ou declamações muito empolgadas e animadas para conquistar os possíveis compradores.


Hoje, a literatura de cordel saiu das ruas, passou pelos livros e chegou às escolas cearenses por meio do projeto Acorda Cordel, idealizado pelo cordelista Arievaldo Viana. “Fui alfabetizado pela literatura de cordel, em 1973. Os folhetos eram as únicas leituras disponíveis. Primeiro, decorava os versos lidos por minha avó. Depois, ela foi me ensinando a identificar as letras e a formar palavras”, disse o poeta na época do lançamento do projeto, que tem como carro-chefe um livro didático de sua própria autoria. O “kit educação” conta ainda com uma coleção de 12 folhetos, composta por clássicos do gênero como O Justiceiro do Norte (de Rouxinol do Rinaré) e Epopeia do Boi Corisco (de José Vidal dos Santos).
Utilizar a poesia popular como meio de instrução sempre foi prática comum nas zonas rurais do Ceará, desde que o gênero despontou, e não é nenhuma novidade. As crianças da Grécia antiga já percorreram esse caminho, como assinalou o historiador cearense Gustavo Barroso em sua obra Ao Som da Viola (1921): “O ensino começava pela poesia, por ser o meio mais fácil de guardar na memória, nessa época em que livro era raro... Assim pôde o povo grego conservar, carinhosamente, de cor, os admiráveis cantos de seus rapsodos”. Hoje, os livros deixaram de ser raridade, mas ainda são caros e inacessíveis. Ao contrário do cordel, a que se tem acesso fácil e é cultuado através dos tempos como a verdadeira e autêntica literatura nordestina, o livro de bolso do povo da região.
Fonte: REVISTA BRAVO – Edição de Outubro de 2009
http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/cultura/cartilha-rima-cordel-salas-aula-cultura-509486.shtml

OSAMA EM CORDEL - II

A MORTE DE BIN LADEN
NA BOCA DO POVO
Antonio Barreto (Santa Bárbara/BA)


 1
O suposto assassinato
Ordenado por Obama
Aniquilando de vez
O seu ex-parceiro Osama
Caiu na boca do povo
Que este cordel proclama.
 2
Quando Obama anunciou
Tal fato no Paquistão
Peguei caneta e papel
Pra colher a opinião
Do povo de Salvador
E cordelizar, então.
 3
Sem nenhuma acanhação
Eu pude aqui registrar
Neste singelo cordel
Da cultura popular
A voz do povo, nas ruas,
Conforme vou lhe mostrar:
 4
— Esse dia 2 de maio
De 2011 o ano
Ficou marcado na história
Pois é o dia do engano:
Um Primeiro de Abril
Ao sabor do ‘americano’!
 5
— Tá pensando que Obama
É Lulinha paz e amor ?!
O gringo lá dos ‘states’
É “o cara” do terror
Além de matar Bin Laden
Planta espinho em vez de flor.
6
— Pode ser até verdade
Mas parece artimanha.
Eu creio que o assassino
Foi o tal do Homem Aranha
Ou talvez o Super-Homem
O dono dessa façanha!
 7
— Quem matou o barbudão
Foi a Mulher Maravilha
Dando viagra a Bin Laden
Numa pequenina ilha
E na hora do “bem-bom”
O cabra “apagou a pilha” !
 8
— Essa história de dizer
Que Obama é pacifista
Exemplar pai de família
Um anjinho africanista
Saiba que o Inferno é cheio
Desse tipo de artista !
 9
— Quem mata a cobra, leitor
E depois não mostra o pau
Não merece confiança
Não avança no degrau
Da justiça e do amor
Porque é um homem mau.
10
— Onde rola prepotência
Arrogância e maldade
Só devemos esperar
Desamor, leviandade:
A farsa se sobrepondo
Sempre em nome da verdade.
(...)

Poeta Antonio Barreto

PARA CONHECER O TEXTO COMPLETO, ACESSE: www.barretocordel.wordpress.com

quinta-feira, 5 de maio de 2011

PESQUISA

São Francisco de Canindé
Na Literatura de Cordel
Autor: Arievaldo Viana
arievaldo_viana@hotmail.com


 
  
A religiosidade é talvez o filão que mais alimenta a poesia popular. A bíblia e as lendas piedosas tiveram traduções as mais variadas na Literatura de Cordel. E diversas também são as versões da eterna luta entre Deus e o Diabo.
Esta tendência faz com que a literatura em torno de São Francisco seja proporcional à romaria em Canindé, comparando-se, por exemplo, a Juazeiro do Norte. E Arievaldo resgata esta trajetória do cordel em torno do "Pobrezinho de Assis/Canindé", dá conta de sua viagem ao Piauí, sua presença milagrosa na Amazônia, sua fuga para a Itália em lombo de jumento e até uma visita imaginada por Gonzaga no "Encontro de São Francisco com o Padre Cícero em Canindé". Um livro indispensável para os estudiosos da Literatura de Cordel.


FONTE: http://www.camarabrasileira.com/cordel10.htm
"... São Francisco de Canindé na Literatura de Cordel é um ensaio bem estruturado, fundado na pesquisa e na análise cuidadosa, arrimadas, estas, não apenas na apreciação e no estudo dos textos coletados, mas também na observação do autor como testemunha de demonstrações desta realidade. O exaustivo trabalho de pesquisa e análise, a investigação sobre os motivos e origens dos textos referidos, a cuidadosa resenha sobre os autores e até a crítica bem propositada, espontânea e corajosa com que se acham pontilhados os comentários neste ensaio, conferem a Arievaldo Viana a autoridade de estudioso, que antes de se pretender ensaísta já era bastante conhecedor da Literatura de Cordel."

Formato 14x21cm - 206pp
Edições Ao Livro Técnico - Canindé - 2002

RIBAMAR LOPES

NOVIDADE NO BLOG DO VIZINHO
Deixando um pouco de lado a Literatura de Cordel, vamos reproduzir trechos de um excelente texto postado por Pedro Paulo Paulino no seu blog VILA CAMPOS ONLINE falando da falta de sorte da amada Meca Franciscana com relação à política:


SALVA, OH! FRANCISCO, TEU CANINDÉ…

Salva, oh! Francisco, teu Canindé, da peste e da praga de políticos maus e corruptos que destroem a cada dia a terra que te deu abrigo. Tu, que na terra foste o mais perfeito seguidor de Cristo, não mereces assistir a tanto desmando, desrespeito e incompetência daqueles que estão à frente do (des)governo desta cidade, adorada por todos que a visitam por causa do grande poder miraculoso da tua fé. Nós, canindeense, temos, oh! São Francisco, a infelicidade de conviver com o desleixo, a corrupção, a sujeira e os escândalos que rotineiramente tomam conta desta nossa cidade. Já faz muito tempo, muito tempo mesmo, que não temos o prazer de ver alguém, revestido de cargo público, que trabalhe com dignidade e perseverança pelo desenvolvimento do teu Canindé, que a cada dia vem sendo dilapidado, açoitado e assaltado por políticos interesseiros e desonestos.
LEIA O TEXTO NA ÍNTEGRA EM: http://www.vilacamposonline.blogspot.com/

quarta-feira, 4 de maio de 2011

CORDEL NO SUDESTE

Feira de São Cristóvão mantém viva a tradição do CORDEL
Clique na foto para AMPLIAR

Escolhido Patrimônio Imaterial do Brasil, o Centro Luiz Gonzaga quer restringir ritmos que não sejam representativos da região
Nicola Pamplona / RIO - O Estado de S.Paulo – Fotos Wilton Junior/ AE
 
Em matéria publicada em agosto do ano passado, o jornal O Estado de São Paulo deu destaque à venda de folhetos na tradicional Feira de São Cristóvão (Rio de Janeiro). Ali, permanecem atuantes os poetas Mestre Azulão (PB), Gonçalo Ferreira (CE) e Marcus Lucenna (RN), este último Diretor Cultural do Centro de Tradições Nordestinas. Veja a seguir, trechos da matéria do “Estadão”:
“No ano em que completa 65 anos de existência, a Feira de São Cristóvão, com sede no Centro Luiz Gonzaga de Tradicionais Nordestinas, na zona norte do Rio, foi declarada patrimônio cultural imaterial do País, mas vive um embate entre a tradição e a invasão de movimentos culturais modernos.”
LINK PARA MATÉRIA COMPLETA
(VER TAMBÉM GALERIA DE FOTOS DA FEIRA)

http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100802/not_imp589222,0.php


Fonte:  Jornal O ESTADÃO – São Paulo
Leia
Texto: Nicola Pamplona
Fotos: Wilton Junior

O AUTO DA COMPADECIDA

E A LITERATURA DE CORDEL
Por Marco Haurélio

As proezas de João Grilo, obra de João Ferreira de Lima
ampliado por Delarme Monteiro, clássico absoluto do cordel.

Foi num folheto de gracejo que Ariano Suassuna encontrou o personagem-símbolo de sua dramaturgia. As Proezas de João Grilo (ver trecho abaixo), história escrita em 1932 por João Ferreira de Lima, trazia como protagonista o célebre amarelinho oriundo dos contos populares portugueses, que, no processo de aculturação, ganhou características idênticas às de outro famoso espertalhão de origem ibérica: Pedro Malazarte. Esse mesmo João Grilo será reaproveitado no Auto da Compadecida, transformado em filme em 2000 por Guel Arraes, com Mateus Nachtergaele (João Grilo) e Selton Melo (Chicó) nos papéis principais.

João Grilo foi um cristão
que nasceu antes do dia,
criou-se sem formosura
mas tinha sabedoria,
e morreu depois da hora
pelas artes que fazia.


(...)

Na noite que João nasceu,
houve um eclipse na lua,
e detonou um vulcão,
que ainda continua.
Naquela noite correu
um lobisomem na rua.

(...)

Entretanto, a Compadecida se baseia em três folhetos distintos, dois deles escritos por Leandro Gomes de Barros. O primeiro é O Cavalo que Defecava Dinheiro, que mostra como um finório consegue lograr um duque invejoso convencendo-o de que um cavalo é realmente capaz de obrar (sem trocadilho) o prodígio do título. Obviamente quem assistiu à peça ou à uma de suas versões para o cinema, sabe que o cavalo foi transmutado num gato, por motivos mais que compreensíveis. O outro poema de Leandro reaproveitado por Suassuna é O Dinheiro (O Testamento do Cachorro), onde aparecem as figuras do padre e do bispo. A autoria de Leandro é inquestionável, embora a origem dos motivos que compõem a estória seja mais difícil de rastrear. O próprio Ariano reconhece essa dificuldade quando afirma: “- a história do testamento do cachorro, que aparece no Auto da Compadecida, é um conto popular de origem moura e passado, com os árabes, do Norte da África para a Península Ibérica, de onde emigrou para o Nordeste”.
 




O cavalo que defecava dinheiro, de Leandro Gomes de Barros
acabou se transformando no "gato que descomia dinheiro"
da peça de Suassuna. (Desenho: Klévisson Viana)


Além destes dois poemas de caráter marcadamente cômico, o Auto propriamente dito – a última parte – tem por base o folheto O Castigo da Soberba, de autoria desconhecida, embrora alguns atribuam-na a Silvino Pirauá de Lima. A história tem a marcante presença do imaginário medieval que impregna a obra de Gil Vicente, outra evidente fonte de Suassuna. Maria (Nossa Senhora) é a advogada. Jesus o Juiz, e o Diabo o acusador. É a Nossa Senhora – a “advogada nossa” da oração Salve Rainha – que a alma recorre, em vista da iminente condenação. Evocada em nome de seu bendito filho, ela responde à súplica da alma. No final, após ouvir acusação e defesa, Jesus – no folheto também chamado Manuel – decide pela salvação da alma. O Diabo (Cão), vencido, chama os seus comandados. A estrofe abaixo reproduzida, com a última fala do tinhoso, está bem próxima do desfecho do Auto da Compadecida:

Vamos todos nós embora
Que o causo não é o primeiro,
E o pior é que também
Não será o derradeiro...
Home que a mulher domina

Não pode ser justiceiro.

Os três folhetos, diga-se de passagem, foram coligidos por Leonardo Mota no livro Violeiros do Norte. Indiretamente, este pesquisador cearense, ao reunir as três obras em seu precioso estudo, apontou o caminho que Ariano Suassuna deveria seguir, mesmo apoiando-se em outras tradições populares – especialmente o Bumba-meu-boi, onde os personagens Mateus e Bastião cumprem um papel semelhante ao de João Grilo e Chicó na Compadecida.




QUEM FOI LEONARDO MOTA

LEONARDO MOTA , folclorista dos maiores que já tivemos, era taquígrafo. Usou a taquigrafia para recolher tudo que podia do nosso folclore.

Leonardo Mota conseguiu registrar, pela taquigrafia, muitos dos improvisos de Sinfrônio, afamado cantador-violeiro cego do Ceará, inclusive algumas disputas entre ele e outros cantadores célebres do interior cearense e nordestino.

Cantadores (1921), Violeiros do Norte (1925), Sertão alegre (1928), No tempo de Lampião (1930), Prosa vadia (1932) e muitos artigos publicados na imprensa fazem parte do acervo literário de Leonardo Mota.

No livro "Adagiário Brasileiro", coletânea de frases colhidas pelo Brasil afora por LM, assim o descrevem Moacir Mota e Orlando Mota, filhos do folclorista: "Em anos seguidos de intermináveis e exaustivas andanças, cruzou e recruzou o Brasil, vendo, ouvindo, observando e anotando, atento a todas as manifestações da alma popular. Fez obra de autêntico bandeirismo nacionalista."

Leonardo Mota nasceu no dia 10 de maio de 1891, um domingo, às 7 horas da manhã, na vila de Pedra Branca, Ceará. Morreu no dia 2 de janeiro de 1948, em Fortaleza, na sua residência, de um colapso cardíaco.

"Em 1921, Leonardo Mota é recebido por Rui Barbosa, que o ouve longamente sobre os seus estudos folclóricos, e para quem Leonardo Mota recita versos e conta anedotas sertanejas. Também o Presidente da República, Epitácio Pessoa, o recebe na intimidade do seu lar, ao lado da família e de amigos. Leonardo Mota fala sobre poesia e linguagem do sertão do Ceará." (Adagiário Brasileiro, pág. 33)

"Em 1924, faz outra viagem aos sertões caririenses em busca de material folclórico e pronunciando conferências. Visita desta vez o Crato, Juazeiro, Barbalha, Ingazeiras, Missão Velha, Senador Pompeu, Aurora..."

‘‘Nasci para viver de lápis em punho, a registrar as inconfundíveis maneiras de falar dos sertanejos de meu país’’, explicava-se ‘‘Leota’’, como o chamavam os amigos e como ele assinava os seus artigos no ‘‘Correio do Ceará’’.

‘‘Violeiros do Norte’’, um de seus livros , foi premiado pela Academia Brasileira de Letras, o que garantiria a Mota o título de ‘‘Embaixador do Sertão’’.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

CORDEL E QUADRINHOS

Um casamento perfeito!



O casamento da Literatura de Cordel com os quadrinhos não é coisa recente. Diversas tentativas foram feitas pela Editora Prelúdio, no início da década de 1960. Foram publicados, naquela época, “Romance do Pavão Misterioso”, com desenhos de Sérgio Lima (hoje reeditado pela Luzeiro/Tupynanquim), “Peleja de Cego Aderaldo com Zé Pretinho”, com desenhos de Nico Rosso, além do “Cancão de Fogo” e da “Chegada de Lampião no inferno”. Parece que o público tradicional (e conservador) do cordel não reagiu muito bem à essa inovação, pois a editora não deu continuidade ao projeto.
Em 1986, baseado num folheto do poeta Gonzaga Vieira, criei um roteiro e desenhei uma HQ chamada “Canindé, cidade da fé”, cuja tiragem de 10 mil exemplares esgotou em menos de dois anos. E olha que obra só foi comercializada na cidade de Canindé, santuário franciscano do Nordeste. Os desenhos ainda bem primitivos, pois na época eu tinha 18 anos e ainda estava engatinhando no uso do nanquim. Trabalho de amador, é verdade, mas feito com muito carinho.


Posteriormente voltei a apostar no casamento CORDEL-QUADRINHOS numa parceria com o mano Klévisson Viana. Em 2003 relançamos um antigo roteiro de minha autoria, já publicado em fanzines, que resultou no álbum “A moça que namorou com o bode”, cuja segunda edição deverá sair em breve.
Outro trabalho nessa mesma linha, que muito me orgulha, é “A história de João de Calais e sua amada Constança”, lançado pela Editora FTD. Trata-se de uma parceria que fiz com o grande ilustrador pernambucano Jô Oliveira. Este livro vem sendo muito bem aceito nas escolas como paradidático.


PAVÃO MISTERIOSO VOLTA A VOAR

Por iniciativa das editoras Luzeiro e Tupynanquim, o Pavão Misterioso em quadrinhos voltou a voar. Vejamos o que diz a respeito, matéria publicada no site “Universo HQ”:

“Não são apenas as grandes obras da literatura brasileira e mundial que merecem ser adaptadas para os quadrinhos. E isso acontece há tempos, como prova o álbum O pavão misterioso - Cordel em quadrinhos (formato 21 x 28 cm, 48 páginas, R$ 25,00, mais as despesas de correio), publicado em parceria pelas editoras Luzeiro, de São Paulo, e Tupynanquim, de Fortaleza.
Trata-se de uma republicação de uma edição lançada originalmente na década de 1960, na qual o desenhista Sérgio Lima levou para os quadrinhos o texto escrito no início dos anos 1920 por José Camelo, autor deste que talvez seja o maior clássico do cordel brasileiro.
Esse resgate aconteceu porque a Luzeiro herdou o acervo da extinta Editora Prelúdio, que, nos anos 1960, publicou uma coleção de cordéis adaptados para os quadrinhos. Quem descobriu a obra foi o pesquisador Marcus Haurélio Fernandes Farias.
O responsável pela nova paginação e pela adequação dos balões foi o editor e quadrinhista cearense Klévisson Viana, autor dos excelentes Lampião... Era o cavalo do tempo atrás da besta da vida e A moça que namorou com o bode.
Na história, o traço de Sérgio Lima dá vida ao intrépido Evangelista e sua amada Creusa, protagonistas da narrativa.
O pavão misterioso já foi adaptado para a televisão, a música e o teatro e, desde sua primeira publicação, o "folheto do Pavão" já vendeu aproximadamente 20 milhões de exemplares.”
A moça namorou um bode... e surgiu um belo álbum de quadrinhos
Por Sidney Gusman (22/12/2003)
Em 1998, quando lançou, pela Editora Hedra Lampião... Era o cavalo atrás da besta da vida, o quadrinhista e cordelista cearense Klévisson Viana "acertou a mão". Além de ganhar o HQ Mix de melhor graphic novel nacional, a edição, alguns anos depois, foi adotada como recurso educacional pelo Ministério da Educação.

Agora, o autor acaba de lançar um novo álbum, que pode trilhar o mesmo caminho. Trata-se do ótimo A Moça que namorou com o Bode, uma adaptação de um cordel de Arievaldo Viana*, publicada por meio de uma parceria de três editoras, a Tupynanquim (Ceará), a Coqueiro (Pernambuco) e o CLUQ (São Paulo).

A história é sobre a bela jovem Chiquinha, que era alvo do desejo de todos os rapazes de uma pequena cidade no sertão do Ceará. O problema é que seu pai era uma verdadeira fera e prometia capar quem dela se aproximasse. Mas, um dia, enquanto tomava banho nua num riacho, um bode espantou do local todos os curiosos que a observavam. Em seguida, por magia, se transformou num belo rapaz e os dois se amaram sob as águas.

No entanto, Chiquinha engravidou, e como convencer a família que o filho era de um bode? Nem mesmo a poderosa "cabacinha" um chá abortivo feito pela sua mãe, Dona Zefinha, surtiu efeito. E a conclusão da trama é interessantíssima. O álbum, uma verdadeira aula de cultura popular, torna-se ainda mais atraente, porque todos os personagens falam num delicioso "nordestinês", e com as rimas próprias do cordel.

Além disso, várias figuras ilustres das artes e da cultura popular fazem "pontas" na história. Confira alguns: Luiz Gonzaga, o poeta Patativa do Assaré, o cartunista Biratan Porto, o bonequeiro Pedro Boca Rica, o cordelista e menestrel João Lucas Evangelista, o "advogado dos pobres" Quintino Cunha e outros.

Pra usar um dito popular, A Moça que namorou com o Bode é bom de "cabo a rabo". Começa com um divertido e criativo prefácio no qual o casal Joseph e Sonia Luyten (colunista do UHQ) travam uma peleja, cada um defendendo sua área de atuação; ele, os cordéis; e ela, os quadrinhos. No final, como fez no álbum de Lampião, Klévisson brinda os leitores com uma série de desenhos com referências visuais sobre pessoas, animais e objetos do Nordeste.


Este maravilhoso trabalho pode ser encontrado em grandes gibiterias do País ou solicitado por e-mail. Para os fãs do (bom) quadrinho nacional, é imperdível!

NOTA DO BLOG:
*  Na verdade “A moça que namorou com o bode” já havia sido publicada como HQ, com desenhos do próprio Arievaldo Viana, no fanzine TRAMELA, em 1988, com o título de “O bode atrasado”. Posteriormente, a trama virou cordel. Klévisson aproveitou essas duas fontes para fazer a sua versão.

João de Calais - Editora FTD