sábado, 25 de junho de 2011

O DISCO DA SEMANA

Zé Gonzaga – Noites de Junho



Sanfoneiro talentoso, bom compositor e bom intérprete, José Januário dos Santos, o Zé Gonzaga, teve sua carreira ofuscada pelo brilho fulgurante de seu irmão Luiz Gonzaga. Mesmo assim deixou um legado de mais de 25 LP's, alguns contendo pérolas do cancioneiro nordestino como: Baile da tartaruga, Mundo velho enganador, Margarida, Pisa na fulô, Camarão é peixe bom, Cheiro da Carolina, Viva o Rei, dentre outros sucessos. Neste disco ele regravou a belíssima NOITES DE JUNHO, que dá título ao LP lançado originalmente na década de 1970. Destaque também para a regravação de Olha pro céu, do repertório de Gonzagão.

Zé Gonzaga – Noites de Junho

Musicas
01 – Casamento de Oswaldinho
02 – Chorar Pra Que
03 – Diga Marieta
04 – Eu Sei, Mas Não Digo
05 – Eu Só Sei
06 – Forró do Pedrinho
07 – Lembrança de Meu Pai
08 – Noites de Junho
09 – O Jacú
10 – Olha Pro Céu
11 – Saudade de Iracema
12 – Zé Calixto no Forró

(Acervo Pessoal: Marquinhos do Forró)
 
Fonte: http://forrotemquesercoladinho.wordpress.com/

VEJA TAMBÉM, outro disco fabuloso de ZÉ GONZAGA no site FORRÓ EM VINIL:

http://www.forroemvinil.com/ze-gonzaga-um-pedacinho-do-nordeste/

sexta-feira, 24 de junho de 2011

MANOEL MONTEIRO HOMENAGEADO

PARQUE DO POVO, EM CAMPINA GRANDE,
EXPÕE FOLHETOS DO POETA MANOEL MONTEIRO

O poeta Manoel Monteiro na casa da poesia no São João de Campina Grande.
(Foto: Daniel Buarque/G1)

Manoel Monteiro é o poeta homenageado.
Fonte: Daniel Buarque Do G1, em Campina Grande (PB)


Uma das principais expressões da cultura popular nordestina divide um pouco da atenção como forró em plena festa de São João no Parque do Povo, principal polo de cerimônias de Campina Grande, na Paraíba, durante o mês de junho. Em um espaço especialmente dedicado à poesia, a literatura de cordel é homenageada junto com um dos principais autores do gênero na cidade, Manoel Monteiro.
“O cordel nunca teve tanta evidência quanto hoje”, disse o poeta em entrevista ao G1 em meio a dezenas de títulos publicados por ele, no Recanto da Poesia – Espaço Manoel Monteiro, sala que leva seu nome.
A explicação dele é que depois de ter seu auge e começar a decair por conta da mídia de massa nos anos 1960, o cordel foi redescoberto pela academia em vários países e passou a ser revisto de forma aprofundada. Uma das comprovações disso, diz, é o fato de o modelo ser título de uma novela, Cordel encantado.
Monteiro contou que já publicou quase 200 cordéis. Alguns deles já atingem a sétima edição, o que significa que foram vendidos mais de 7 mil exemplares. “A cultura de massa nunca morre”, disse. Os livrinhos são encontrados em bancas de revista da Paraíba, e muitos deles já foram digitalizados e colocados na internet.
Segundo ele, seu trabalho começa com a escolha de um tema, seguido pela pesquisa e pelo trabalho de escrever poesia sobre aquilo, passando então ao computador, que ele nem usa. “Não sei nem ligar um computador”, contou.
Em meio a biografias e obras de crítica social, alguns cordéis falam de cornos e piadas, mas isso não precisa desmoralizar o trabalho sério. “Tem muita gente que faz cordel de brincadeira, mas eu levo muito a sério”, disse, fazendo alusão a novas edições de cordeis seus em formato de livro, que vão ser usados em escolas e universidades do Brasil.


quinta-feira, 23 de junho de 2011

ACORDA, SÃO JOÃO!


Do blog "Cordel Atemporal", do nosso amigo Marco Haurélio, pinçamos essa ótima postagem sobre São João:

O São João dorminhoco da tradição popular, que segura o mundo, aparece na canção São João Dormindo, interpretada pelo inesquecível Elino Julião e composta por Nito Canhete e Aleixo de Freitas:

Acorda meu São João, acorda
Acorda para ver seu dia
Rua enfeitada, fogueira acesa
Quentão na mesa e muita alegria

A noite é linda, o céu estrelado
Os namorados tão se divertindo
Bomba estourando, balão subindo
E não sei porquê meu São João dormindo

A lua vem surgindo cor de prata
Por trás da mata uma estrela brilhou
Para continuar nossa amizade,
Vamos ser cumpadre que São João mandou



Imagem: São João Batista (do mestre do Barroco, Caravaggio)

Outra música belíssima do período junino é SÃO JOÃO DO CARNEIRINHO,
da dupla LUIZ GONZAGA / GUIO DE MORAIS:

Eu plantei meu milho todo no dia de São José
Se me ajuda a providência, vamos ter milho à grané
Vou "coiê" pelos meus "caico"(cálculo)
20 espiga em cada pé
Pelos "caico" (cálculo) eu vou "coiê"(colher) 20
espiga em cada pé

Ai São João, São João do Carneirinho
Você é tão bonzinho
Fale com São José, fale lá com São José
Peça Pra ele me ajudar
Peça pra meu milho dá
20 espiga em cada pé.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

CORDEL NOS PAMPAS


Na foto: Jô Oliveira, Arievaldo Viana, Luiz Coronel,
Paixão Côrtes (patrono da feira) e o cartunista Santiago.


UM ENCONTRO ENTRE O RIO GRANDE DO SUL E O NORDESTE


Texto publicado no dia 30 de outubro de 2010, no BLOG DO LEITOR da
56ª FEIRA DO LIVRO DE PORTO ALEGRE


Originária do Nordeste brasileiro, a literatura de cordel invade a 56ª Feira do Livro de Porto Alegre na forma de contos do escritor gaúcho Simões Lopes Neto. O evento Conversando sobre cordel e causos gaúchos reuniu, na Arena das Histórias, o ilustrador pernambucano Jô Oliveira, o poeta cearense Arievaldo Viana, o chargista gaúcho Santiago, o poeta Luiz Coronel e o patrono Paixão Côrtes.

- A literatura de cordel que representa o sentimento do nordestino agora atinge o linguajar do Rio Grande do Sul, declarou Paixão Côrtes, fazendo referência aos dois contos gauchescos de Simões Lopes Neto (Melancia e Coco Verde e 300 Onças) adaptados para o cordel.

Um dos realizadores deste trabalho, Arievaldo Viana, lembrou da admiração pelo escritor gaúcho e ainda proferiu contos e causos oriundos do Ceará, adotando a linguagem característica do sertão. Jô Oliveira admitiu que a ideia de trazer a literatura de cordel para o Rio Grande do Sul já era antiga:

- As obras de Simões Lopes Neto representavam um sentimento de que precisávamos fazer essa aproximação.

Santiago acredita que o escritor soube adaptar o linguajar do gaúcho “sem assassinar a língua portuguesa. Paixão Côrtes conclamou o início de seus trabalhos de pesquisa nos anos 40, os quais revelam que as únicas imagens que o gaúcho representava a si próprio tinham raízes nos caubóis americanos. O poeta Luiz Coronel ressaltou a importância da obra popular:

- Não há grande obra que não tenha passado pela esfera popular. E isso tem muito a ver com o povo gaúcho, representado na figura do patrono deste ano. Em 2010, a Feira se mirou no espelho e viu que tinha um bigode bonito.

ARIEVALDO E JÔ OLIVEIRA NA FEIRA DE 2011

Em novembro de 2011 Arievaldo e Jô Oliveira retornarão a Porto Alegre para participar da 57ª edição da Feira do Livro com duas adaptações para o cordel do livro CASOS DE ROMUALDO, de Simões Lopes Neto. Os "casos" escolhidos são: Romualdo entre bugios e Quinta de São Romualdo. A dupla fará palestras e oficinas em escolas públicas do Rio Grande do Sul.

ALBERTO PORFÍRIO


UM MESTRE DA POESIA POPULAR

Por Arievaldo Viana*


Desde que me entendo por gente tenho mantido um contato permanente com a poesia popular. Meu pai, Evaldo de Sousa Lima, agricultor e poeta, tinha enorme facilidade para decorar folhetos de cordel, canções e até longos trechos de cantorias que assistia. No dia seguinte, seu prazer era reproduzir em voz alta os versos retidos na memória, com desenvoltura e entusiasmo, durante o exercício de sua lida diária. Às vezes íamos buscar água no olho d’água das Coronhas, no sopé do serrote dos Três Irmãos, um lugarejo situado na confluência dos municípios de Quixeramobim, Canindé e Quixadá, CE. Durante o trajeto, ele costumava cantar ou declamar diversos poemas, dentre os quais os folhetos Batalha de Oliveiros com Ferrabrás e Juvenal e o dragão, ambos de Leandro Gomes de Barros, e uma plangente canção intitulada “A voz do Siqueira”, homenagem que o poeta Alberto Porfírio fez ao velho cantador João Siqueira do Amorim, o parceiro mais constante do grande Domingos Fonseca, que perdera a voz após uma exaustiva maratona de apresentações Nordeste afora.

Por esta razão, posso afirmar seguramente, que ouço falar de Alberto Porfírio desde a minha primeira infância, pois na casa de meus avós aconteciam cantorias e dentre os poetas convidados estavam Alberto, seu irmão José Porfírio e o cantador Antônio Ribeiro Maciel, de Quixeramobim. Minha avó, Alzira de Sousa Lima, colecionava folhetos de cordel e tinha prodigiosa memória. Geralmente ela os adquiria nas festas do Canindé ou das mãos de um certo Damásio, que morava em Boa Viagem e que desconfio ser o poeta e xilogravador Damásio Paulo da Silva, que durante muitos anos foi funcionário de José Bernardo da Silva, na antiga Tipografia São Francisco, a mesma que viria a se chamar posteriormente de Lira Nordestina, em Juazeiro do Norte. Foi minha avó quem me alfabetizou a partir dos folhetos As proezas de João Grilo e A vida de Cancão de Fogo e seu testamento.

Meu avô, Manoel Barbosa Lima, era um pequeno comerciante e agro-pecuarista. Viajava constantemente para Quixadá, Quixeramobim e Canindé. Era amigo dos cantadores e também tinha grande admiração pela chamada Literatura de Cordel. Mas não era de seu agrado que meu pai se tornasse um repentista, pois considerava a profissão incerta. Na verdade ele não queria que meu pai botasse uma viola nas costas e ganhasse o “oco do mundo”, como se dizia na época, longe de suas vistas e de sua proteção paternal. Em 1978 eu tinha entre 10 e 11 anos de idade, quando meu pai apareceu com uma grande novidade: um livro que marcou profundamente a minha infância e se tornou companheiro inseparável da nossa família até os dias de hoje. Era o Poetas Populares e Cantadores do Ceará, de Alberto Porfírio (Horizonte Editora, 1978), poeta que eu já conhecia de nome e de versos. As rádios costumavam divulgar seus escritos, sobretudo os poemas matutos A estátua do Jorge e Cantiga da Dourinha, que faziam sucesso na voz do saudoso radialista Guajará Cialdini, fã do poeta e divulgador incansável de sua obra. Guajará declamava com desembaraço e encanto, fazendo com que nos tornássemos, cada vez mais, admiradores da lira maviosa do mestre Porfírio. O escritor Luciano Barreira, autor de Os cassacos, referindo-se à primeira parte de Poetas Populares e Cantadores do Ceará diz que a mesma “é composta de criações poéticas moldadas na simplicidade e na grandeza da poesia mais pura, essa que brota quase sempre de improviso, à sombra do alpendre ou da latada sertaneja. Versos cheios de lirismo e ao mesmo tempo de lições de elevado cunho humano”.

Esse livro, de pouco menos de 150 páginas, é uma obra essencial para todos que amam a poesia popular. Além de apresentar uma série de poemas matutos da lavra do autor, traz ainda dados biográficos de vários cantadores e saborosos fragmentos de cantorias realizadas por outros poetas cearenses, dentre os quais essa pérola que apresentaremos a seguir, proferida no calor de um desafio, por seu irmão José Porfírio. Vamos contar o caso do princípio. Um policial, por nome Tenente Paes, entendeu de acabar uma cantoria, após exigir dos repentistas a apresentação de um alvará. Ante a perplexidade dos poetas, que não tinham conhecimento de tal exigência, resolveu arbitrariamente cobrar 20% do valor arrecado na bandeja dos cantadores, dinheiro ensombrado de suor e talento, ganho a duras penas naquela feira sertaneja. E assim o fez: meteu a mão na bandeja, contou o dinheiro, tirou a sua parte e se retirou autoritariamente. Mal o tenente dobrou a esquina, Zé Porfírio saiu-se com este genial trocadilho, que lembra os momentos mais fulgurantes de seu colega de profissão Lourival Batista, o Louro do Pajeu:

No sertão atualmente
Ninguém se diverte mais
Porque o tenente Paes
Acaba com a paz da gente.
Terroriza o ambiente
Onde há divertimento...
Até briga de jumento
Se houver gente pagando
O tenente Paes chegando
Vai cobrar vinte por cento!



O POETA E SUA OBRA

Como poeta de bancada, Alberto Porfírio é autor de quase 100 livrinhos de cordel. Explorou de forma pioneira temas como a ecologia, combate ao tabagismo e outros vícios que degradam o ser humano. Também enveredou pela denúncia social de maneira consciente e vigorosa. É o que vemos, por exemplo, no Romance de Rosa Alice e muitos outros folhetos de sua lavra, oportunamente reeditados pela Tupynanquim Editora. Aliás, a figura do Alberto cordelista ganhou nova dimensão depois que o poeta fez amizade com o editor Klévisson Viana, seu admirador desde a infância. Além dos folhetos publicados na linguagem vernacular, Alberto também é autor de uma extensa coletânea de “poemas matutos”, dentre os quais se destacam: As moças da cachoeira, Meu cachorro caçador, Eu gostei mais foi do cão, No tempo da lamparina, A estátua do Jorge, Meu boi Dengoso, Porque não aprendi a ler e o pitoresco Idéias de Caboclo, do qual reproduziremos alguns trechos:

“O professô dos menino
Fala, fala chega estronda!
Querendo qui eu acredite
Qui a terra seja redonda.

Não, senhor, num acredito
Nunca pude acreditá
Qui viva assim todo mundo
Andando em cima duma bola
Sem nunca iscorregá!

Vós mincê preste atenção,
Um monstro cuma é o trem!...
Se a terra fosse redonda,
Iscorregava tombém.

(...)


Num acredito!... não! não!
Qué sabê cuma é a terra
Na minha maginação?
É um prato feito de barro
Mal feito mais bem grandão!
Emborcado em riba d’água
N’uma firme pusição,
Cum a gente morando in riba
Cum toda satisfação.

Vou prová cuma é mermo
Vou dá toda a insplicação:

Quando Deus fez este mundo
Mandou a terra secá,
Mandou se juntá as água
E foi assim qui fez os má.
E se a terra fosse doida
Rodando pra se acabá,
Tinha derramado as água
E era até pirigoso
O próprio Deus se afogá.

Tá certo ou num tá?!


(...)


Além de poeta, popular e erudito, Alberto também dominava a prosa com facilidade. O dramaturgo paraibano Ariano Suassuna assegura que não existe essa separação entre cultura popular e erudita. “O que existe é cultura boa e cultura ruim”, afirma.  Seguindo este preceito, podemos afirmar que a cultura de Alberto Porfírio é das melhores! Antes de falecer, o poeta já havia publicado vários livros. O primeiro deles é Poetas Populares e Cantadores do Ceará (1978), do qual já fizemos uma modesta apreciação. Escreveu, posteriormente, para a UGF Editora, de Minas Gerais, em parceria com escritores escolhidos do Brasil o livro Conta Brasil 2000. Sua terceira obra é o Livro da Cantoria, metodologia do repente e do cordel que foi escrito nas pequenas cavernas de Quixadá. É que o poeta costumava se refugiar no sossego dos monólitos para compor os seus textos. Seu quarto livro foi o recém-publicado As noites de viola da Casa de Juvenal de Galeno, das quais foi um participante assíduo e grande incentivador. O que mais se destaca nesse livro é a sua capacidade de reconhecer o talento alheio, mesmo entre os poetas mais simples e pouco apreciados pelas massas. Graças a Alberto puderam chegar aos nossos dias fagulhas do estro de poetas quase anônimos como Chico Buriti, Bem-te-vi Neto, Urcino Borborema, Antônio Limeira, Chico Raimundo, Pedro Cezário Bezerra, Roque Machado, dentre outros.

O poeta potiguar Crispiniano Neto costuma dizer que alguns artistas deveriam dormir de beliche – uma cama para o corpo, outra para o ego. Definitivamente este não é o caso do Mestre Alberto Porfírio, um homem que sabia distinguir uma fagulha de talento numa fogueira de vaidades. Que sabia, sobretudo, reconhecer o mérito dos outros, dando o devido valor a quem merecia. Diferente de muitos que vivem falando pelos cotovelos e fazendo apologia ao próprio umbigo em busca de autopromoção. Sua obra como poeta foi coroada com a publicação do livro Os 100 sonetos de Alberto Porfírio, muitos dos quais recitava de cor, mesmo depois de ter sido acometido pela grave doença que o vitimou. Já perto de morrer, começou a escrever esta autobiografia, que oportunamente foi lançada com apoio da SEDUC, e deixou inédita uma obra intitulada Histórias que o povo conta.

Além de sua atividade como repentista e poeta de bancada, também desempenhou com brilho as atividades de professor, fotógrafo, xilógrafo e escultor. Dentre as suas obras mais conhecidas nesta última atividade citada, destacamos as seguintes: a estátua de Cego Aderaldo em Quixadá (em parceria) e a estátua do Pe. Zé Bezerra, no Choró; a do cantador do Brasil, em Brasília (inaugurada pelo ex-presidente José Sarney). Ainda esculpiu as estátuas do Frei Damião, em Apodi, no RN e a estátua do cantador Eliseu Ventania, em Mossoró. Tem ele o seu espaço cultural em Quixadá onde escreveu, nas pedras, inúmeros sonetos e, esculpiu estátuas de personalidades como a da famosa escritora Rachel de Queiroz.
Perguntado qual a obra de sua estima ele respondeu: Da minha literatura a que eu mais gosto é o folhetinho de 08 páginas intitulado “Um sonho dourado” e das esculturas a obra que eu mais gosto é a viola de cimento que toca. Numa entrevista, alguém admirado, perguntou por que ele se escondia nas pedras de Quixadá para estudar e escrever os seus livros, ele disse: - Lá, mais facilmente, a gente se concentra em Deus ao olhar a natureza e fica inspirado para escrever. Deus pôs o homem na Terra exclusivamente para estudar, trabalhar e produzir para ajudar na construção do mundo.

Alberto queria muito que um de seus filhos desse continuidade à sua obra, mas isso não foi possível. Diante disso, elegeu os pássaros de seu pomar como herdeiros legítimos de seu estro. Essa vontade está expressa neste belo poema:

UM FELIZ DESTINO

Eu falo para os senhores
Que nasci para cantar
Muito embora em meu lugar
Fui o rei dos cantadores
Enfrentei opositores
Saí como campeão
Assumi a profissão
Com o melhor desempenho
Ao morrer sei que não tenho
A quem passar meu bastão.

Eu tive filhos bastante
Nenhum quis ser cantador
Um deles quis ser doutor
O outro comerciante
Se eu morrer, qualquer instante
Nenhum me tem como guia
Um rio de poesia
Pelo deserto se perde
Porque não tenho quem herde
O bastão da cantoria.

Dou a verdadeira prova
Que é um dom a cantoria
O Jocélio, o Zé Maria,
Os pais viveram da trova
Ivanildo Vila Nova
É filho de Zé Faustino
E, Moacir Laurentino
Foi com o pai que aprendeu
Nenhum filho meu nasceu
Com esse feliz destino.

No dia que eu me ausentar
De minhas atividades
Deixarei minhas saudades
Às aves do meu pomar,
Elas sabem que cantar
É sintoma de alegria,
O bastão da cantoria
E a minha vida feliz,
Deixarei aos bem-te-vis
Que cantam ao nascer do dia.

* Poeta popular, criador do projeto Acorda Cordel na Sala de Aula


terça-feira, 21 de junho de 2011

AVES DE ARRIBAÇÃO

Hoje pela manhã, fazendo o trajeto Fortaleza – Caridade, vi pela janela do ônibus milhares e milhares de avoantes (cujo nome cientifico é Zenaida Auriculata) em migração. O espetáculo é belíssimo e impressiona pela solidariedade de alguns grupos que parecem voar em circulos esperando os retardatários.
Os caçadores, pressentido a sua chegada, que acontece no final da quadra invernosa nordestina entram imediatamente em ação abatendo-as sem piedade e, o que é pior, destruindo os pombais onde as mesmas depositam seus ovos.
Na Revista Brasileira de Zoologia, Vol. 3. Número 7, Curitiba, 1986, encontramos essa informação sobre a presença dessas aves na Caatinga Nordestina:
“Na região da caatinga brasileira, a avoante é novamente encontrada em grandes números, referindo-se a ela vários cronistas do século passado e início deste como um auxílio divino às populações humanas carentes, sempre nidificando no solo em colônias. Somente em meados desse século aparecem os primeiros relatos científicos sobre sua nidificação no solo de caatinga (Ihering, 1935). O primeiro autor a se preocupar mais profundamente com o assunto foi Álvaro Aguirre, produzindo vasta bibliografia sobre as colônias de reprodução e hábitos alimentares. Seu trabalho mais completo foi publicado em 1976, dissecando os conhecimentos existentes sobre a biologia, ecologia e utilização desse recurso natural renovável pelo nordestino (Aguirre, 1976).
Todos esses autores referem-se à população nordestina de Zenaida aureculata como a única a nidificar colonialmente no chão, considerada característica peculiar à subespécie da região (Z. a. noronha). Fora do Nordeste, há notas sobre ninhos isolados no solo no Estado de São Paulo (Aguirre, 1972)e em pequenas colônias no Equador (Marchant in Goodwin, 1970)
Desde 1979, o problema do abate ilegal de avoantes na região Nordeste vem preocupando de perto o Departamento de Parques Nacional do IBDF. A partir daquele ano tem início uma série de trabalhos de campo melhor compreensão do fenômeno e para a conservação desse recurso natural renovável, sobre-explorado e colocado em risco de extinção pela exploração irracional para comércio da carne de avoante salgada. A partir de 1982, o trabalho, que visa principalmente compreender, através de anilhamento, os movimentos da espécie na região conta com o apoio do CNPq.”
Como já foi dito, a avoante é uma ave de imigração que aparece em determinada época do ano no sertão nordestino. A avoante chega na quadra de fins d’água, em bandos, nas caatingas, passando nos lugares onde encontra o capim-milhã, que é a alimentação que prefere. Os caçadores, apesar da forte vigilância do IBAMA, entram em ação e abatem uma quantidade enorme, que são vendidas nas feiras. É um massacre injustificado que ameaça a preservação dessa espécie. O que mais impressiona é a crueldade dos caçadores que, não satisfeitos em abater milhares de aves, ainda se comprazem em pisotear os ninhos (feitos geralmente no chão) pelo simples prazer de destruir os ovos. No nordeste brasileiro a pomba-avoante (“avoante”) parece ter o seu padrão de migração em função ao regime de precipitação pluviométrica.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

O SERTÃO É O MUNDO



FAZENDA OURO PRETO


Foi Guimarães Rosas o autor da frase "o sertão é o mundo". Esse é o mundo de minha infância. Foi aqui, no casarão da Fazenda Ouro Preto (na fronteira dos municípios de Canindé e Quixeramobim) que eu passei os dez primeiros anos da minha existência. A casa dos meus pais, onde se criaram meus irmãos mais novos, ficava um pouco mais adiante, em direção ao serrote dos Três Irmãos, localidade que já pertence ao município de Canindé.

Em 1986, esse território que pertencia ao distrito de São José da Macaóca desmembrou-se de Quixeramobim para formar a área do recém-criado município de Madalena.  No alpendre, meu avô Manoel Barbosa Lima contava histórias de trancoso e contos tradicionais brasileiros (Como a RAPOSA E O CANCÃO, BICHO FOLHARAL, PEDRO MALAZARTES etc). Minha avó, Alzira de Sousa Lima, lia folhetos de cordel depois do jantar, sob a luz do lampião a gás. Essa antena parabólica é coisa de uns cinco anos para cá. No meu tempo de menino, só havia o baú de folhetos, um exemplar da Bíblia Sagrada e um rádio velho à válvula, onde se ouvia a Difusora Cristal de Quixeramobim e a Rádio Tupynambá de Sobral. Eh, saudades...

ARIEVALDO VIANA

Yuri, no batente da janela do quarto da avó Alzira


Alpendre do casarão, construído no final da década de 1950


domingo, 19 de junho de 2011

OS DOIS LADOS DA MOEDA



Democracia é isso! Na postagem de ontem mostramos o lado humorístico e folclórico em torno da Lei Maria da Penha. Hoje, pretendemos mostrar o lado sério da coisa, reproduzindo trechos do excelente poema 'A Lei Maria da Penha em Cordel", do poeta cearense Tião Simpatia. A violência contra a mulher é uma ação covarde e merece ser punida com os rigores da lei. Afinal, como os poetas sempre dizem:  em mulher não se bate nem com uma flor! Tião, juntamente com Zé Maria de Fortaleza, Rozamato e outros colegas formam o excelente grupo BATUTA NORDESTINA.

Vejamos alguns trechos do cordel de TIÃO SIMPATIA, impresso pela Tupynanquim Editora, com capa de Klévisson Viana:

I
A Lei Maria da Penha
Está em pleno vigor
Não veio pr’a prender homem
Mas pr’a punir agressor
Pois em “mulher não se bate
Nem mesmo com uma flor”.

II
A violência doméstica
Tem sido grande vilã
Por ser contra a violência
Desta lei me tornei fã.
Pr’a que a mulher de hoje
Não seja vítima amanhã.

III
Toda mulher tem direito
A viver sem violência
É verdade, tá na lei.
Que tem muita eficiência
Pr’a punir o agressor
E à vítima, dar assistência.

IV
Tá no artigo primeiro
Que a lei visa coibir;
A violência doméstica
Como também, prevenir;
Com medidas protetivas
E ao agressor, punir.

V
Já o artigo segundo
Desta lei especial
Independente de classe
Nível educacional
De raça, de etnia;
Opção sexual…


VI
De cultura e de idade
De renda e religião
Todas gozam dos direitos
Sim, todas! Sem exceção.
Que estão assegurados
Pela Constituição.

VII
E que direitos são esses?
Eis aqui a relação:
À vida, à segurança.
Também à alimentação
À cultura e à justiça
À Saúde e educação.

VIII
Além da cidadania
Também à dignidade
Ainda tem moradia
E o direito à liberdade.
Só tem direitos nos “As”,
E nos “Os”, não tem novidade?

IX
Tem direito ao esporte
Ao trabalho e ao lazer
E o acesso à política
Pr’o Brasil desenvolver
E tantos outros direitos
Que não dá tempo dizer.

X
A Lei Maria da Penha
Cobre todos esses planos?
Ah, já estão assegurados
Pelos Direitos Humanos
A lei é mais um recurso
Pr’a corrigir outros danos.

XI
Por exemplo: a mulher
Antes da lei existir,
Apanhava, e a justiça
Não tinha como punir
Ele voltava pra casa
E voltava a agredir.

XII
Com a lei é diferente
É crime naceitável.
Se bater, vai pr’a cadeia!
Agressão é intolerável.
O Estado protege a vítima
Depois pune o responsável.

(...)

Fonte: http://tiaosimpatia.blogspot.com/

O DISCO DA SEMANA


Colaboração do José de Sousa, de Guarabira – PB



Esse é o raríssimo e histórico álbum que iniciou as coletâneas juninas. Na época, Abdias era diretor artístico da CBS e conseguiu montar um time de primeira linha na parte de forró. Nos anos seguintes, a gravadora receberia o reforço de Jackson do Pandeiro, Zé Gonzaga e outros grandes artistas nordestinos. Um disco único.Participaram da coletânea Marinês, Coronel Ludugero, Abdias, Trio Nordestino, Osvaldo Oliveira e Jacinto Silva.

Coletânea – Pau de sebo vol. 1
1967 – CBS

01 Marinês – O sol nasceu (Onildo Almeida)
02 Coronel Ludugero – Brinca de ané (Dilson Dória – Hélio Gomes)
03 Abdias – Segura o pé de bode (Adapt. Abdias Filho)
04 Trio Nordestino – No garpão da bulandeira (João Silva – K-Boclinho)
05 Osvaldo Oliveira – Prepara a fogueira (Osvaldo Oliveira – Dilson Dória)
06 Jacinto Silva – Amei amei (D. Mathias – Jacinto Silva)
07 Trio Nordestino – Brincadeira na fogueira (Antonio Barros)
08 Abdias – Zefinha das Camorânas (Onildo Almeida)
09 Jacinto Silva – Rosa branca (Jacinto Silva – R. Sandoval de Melo)
10 Marinês – Rosa amarela (Onildo Almeida)
11 Coronel Ludugero – Eu vi passar (Onildo Almeida)
12 Trio Nordestino – Tem Geny (Juracy Alcantara)

Para baixar esse disco, clique aqui.

Fonte: http://www.forroemvinil.com/coletanea-pau-de-sebo-vol-1/