segunda-feira, 8 de julho de 2013

DEBATENDO O PRECONCEITO NO CORDEL


 
Uma das obras selecionadas pelo projeto ACORDA CORDEL é o polêmico folheto "Peleja de Cego Aderaldo com Zé Pretinho do Tucum". Sugerimos a realização de debates, em torno de folhetos “polêmicos”, levando-se em consideração a época em que foram escritos e os valores vigentes na sociedade daquele tempo. É o caso de Peleja de Cego Aderaldo com Zé Pretinho do Tucum (escrita por Firmino Teixeira do Amaral, em 1916), em cujo texto estão presentes duas formas de preconceito social - o preconceito de cor e a rejeição ao deficiente (no caso de Aderaldo, deficiência visual). Se o leitor observar atentamente, em alguns momentos o preconceito contra o Cego é ainda maior do que contra o Negro:

“O dono da casa disse:
—  Zé Preto, pelo comum,
Dá em dez ou vinte cegos
Quanto mais sendo só um!
Mando já ao Tucumanzeiro,
Chamar o Zé do Tucum.

(...)  Levaram o negro pra sala
E depois para a cozinha;
Lhe ofereceram um jantar
De doce, queijo e galinha,
Para mim veio um café
E uma magra bolachinha.

Depois trouxeram o negro,
Colocaram no salão,
Assentado num sofá
Com a viola na mão,
Junto duma escarradeira,
Para não cuspir no chão.

Ele tirou a viola
De um saco novo de chita,
E cuja viola estava
Toda enfeitada de fita.
Ouvi as moças dizendo:
— Oh, que viola bonita!

Então, para eu me sentar,
Botaram um pobre caixão,
Já velho, desmantelado,
Desses que vêm com sabão.
Eu sentei-me, ele vergou
E me deu um beliscão.

Eu tirei a rabequinha
De um pobre saco de meia,
Um pouco desconfiado
Por estar em terra alheia;
Aí as moças disseram:
— Meu Deus, que rabeca feia!

Uma disse a Zé Pretinho:
— A roupa do cego é suja!
Botem três guardas na porta,
Para que ele não fuja,
Cego feio, assim de óculos,
Só parece uma coruja.”

Um comentário:

  1. Para saber é preciso ser negro, mas nenhum tipo de preconceito pode ser maior que o racial. Pois atinge uma grande parte da população,e é histórico, anulando suas chances de participação na vida social. Não pode ser comparado a "azares" existenciais, como cegueira ou obesidade. Mas é bom que haja espaço para o debate, sem uso do proselitismo tendencioso. Artisticamente, vamos lá que a tendência da peleja assim se constitua, mas na história nacional se trata de uma tragédia que nunca poderá ser redimida, mesmo que o opressor tenha se posto à frente, tentanto ombrear com o oprimido, empanando a sua vez de sujeito histórico. Por outro lado, não é o paternalismo que se busca, mas a chance de ter o mesmo ponto de partida, a chegada dependendo, imparcialmente do valor de cada um. É preciso prestar mais atenção às estatísticas sociais. Terreno de fato, não frequentado pela arte.

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