segunda-feira, 4 de julho de 2011

O BAÚ DA GAIATICE

ARIEVALDO E A ARTE DE FAZER RIR

BLANCHARD GIRÃO
 jornalista e escritor

Se alguns resquícios etílicos ainda me afetavam o fígado, foram definitivamente curados. Tudo por conta do "Baú da Gaiatice", de Arievaldo Viana, que lí de uma tirada só no último fim-de-semana. Ri a bandeiras despregadas com os "causos" colhidos no filão riquíssimo da cultura popular em suas diversas vertentes, a sertaneja, em primeiro lugar, a suburbana e a anedótica nascida nos meios mais intelectualizados.
Tudo seria vulgar não fosse a capacidade própria de Arievaldo no saber contar, dando a cada estória o seu toque pessoal, a sua graça de humorista.
Nesta coletânea, enriquecida pelo traço irreverente de Klévisson (irmão do autor) e a colaboração valiosa de Pedro Paulo Paulino, Tarcísio Matos, Sílvio Roberto Santos e Jota Batista, deparamo-nos com autênticas jóias do humor, capazes de fazer inveja a um Quintino Cunha, a Emílio de Menezes ou a essa turma que, outrora no Pasquim, hoje empolga o País pelas páginas do novo sucesso editorial brasileiro, a revista "Bundas".
Personagens marcantes, como esse incrível Broca da Silveira, Tia Santana, Miguel Carpina, Zé Freire e muitos outros, joeirados pelo autor e seus colaboradores nas conversas de bodegas do interior e da periferia da cidade grande, colocam-nos diante de estórias hilariantes, reunindo o jocoso, o irônico, o espontâneo e o absurdo que se encontram sob a aparência geralmente rude do homem comum.
"O Baú da Gaiatice" tem o sabor de um cinema-mudo chapliniano, embora sem quaisquer pretensões estéticas. É a pedra preciosa em seu estado de pureza, ligeiramente lapidada pelo talento de quem a reapresenta. Momentos de autêntico estudo da psicologia da alma ingênua do povo, que nem todos têm a competência de perceber e revelar na plenitude de sua beleza.
Em "Sabugo Reciclável", "As Naftalinas", "A Festa do Zuca" ou em "Um Jegue que me Carregue"- para lembrar apenas algumas das estórias singelas que Arievaldo cascalhou no manancial inesgotável da alma da rua  está o melhor do humor cearense dos dias presentes. E olhe que humor é o forte dessa gente que, com Chico Anysio, Falcão, Renato Aragão e muitos outros, tem conseguido provocar a alegria desse Brasil tão amargo do momento.
Vale a pena adquirir e ler "O Baú da Gaiatice", com apenas 134 páginas, abrigando um fantástico universo de "causos" capazes de levar às gargalhadas o mais circunspecto dos homens.

(Artigo publicado no jornal O ESTADO, em junho de 1999)

4 comentários:

  1. O saudoso jornalista Blanchard Girão resumiu muito bem em seu artigo o que é o livro O Baú da Gaiatice, de Arievaldo. A publicação surgiu quando a cultura regional, em Canindé, respirava a custo. Foi a concretização de um projeto alcançada pelo Ari por conta do seu talento e dinamismo, coroando àquela época sua trajetória de pesquisador, cordelista e escritor. O sucesso do livro inspirou o surgimento, no ano seguinte, da segunda edição do "Baú". Puxou também um filão que viu o nascimento mais tarde de outras publicação do gênero, de outros autores. Cobremos, portanto, de Ari sua tão esperada "Mala da Cobra", um trabalho redimensionado do "Baú". Pois é poeta, o hiato entre uma publicação e outra está se tornando extenso. Atenção, senhores editores: Ari tem mais coisa inédita que merece vir logo à lume, como a biografia de Leandro Gomes de Barros.

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  2. Ari é seu livro, a mesma verve encontrada no homem pode ser aferida no hilário volume. Houve alterações significativas da primeira para a segunda edição, de forma, que, pessoalmente, gosto mais da edição original. É sempre bom reler clássicos como o Poeta e a Boneca e a Peleja de Dois Mosquitos contra o Negão de Um Olho Só, onde reina o tom fescenino, raríssimo no cordel de velha cepa. Essa obra deveria estar à venda, pois representa de forma única o anedotário do Sertão Central, com destaque para a cidade do santo imitador de Jesus.

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  3. COM ALGUMA REVISÃO...

    O saudoso jornalista Blanchard Girão resumiu muito bem em seu artigo o que é o livro O Baú da Gaiatice, de Arievaldo. A publicação surgiu quando a cultura regional, em Canindé, respirava a custo. Foi a concretização de um projeto alcançada pelo Ari por conta do seu talento e dinamismo, coroando àquela época sua trajetória de pesquisador, cordelista e escritor. O sucesso do livro inspirou o surgimento, no ano seguinte, da segunda edição do "Baú". Puxou também um filão que viu o nascimento mais tarde de outras publicações do gênero, de outros autores. Cobremos, portanto, de Ari sua tão esperada "Mala da Cobra", um trabalho redimensionado do "Baú". Pois é, poeta, o hiato entre uma publicação e outra está se tornando extenso. Atenção, senhores editores: Ari tem mais coisa inédita que merece vir logo à lume, como a biografia de Leandro Gomes de Barros.

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  4. Caros amigos e parceiros Pedro Paulo Paulino e Silvio Roberto, como vocês sabem a publicação do Baú da Gaiatice foi fruto de uma longa batalha, catando patrocinios e ajuda de toda a espécie. A editora VARAL, hoje extinta, capitaneada pelo dinâmico Vescêncio Fernandes, sabia tirar leite em pedra e abrir portas herméticas a cata de tostões. A segunda edição já veio em fase mais tranquila, em plena arrancada pela revitalização do cordel. Foi o reconhecimento do nosso esforço. O que tenho notado da parte dos editores, tanto daqui do Ceará quanto do Sudeste, é o interesse cada vez mais frequente por adaptações de obras já consagradas para a linguagem do cordel. Não querem ousar apostando em novidades. É por isso que "Mala da Cobra" e a biografia do poeta Leandro Gomes de Barros permanecem inéditos há vários anos. E, curiosamente, é o que considero de mais interessante na minha produção. Participar de editais e concursos governamentais é desestimulante, haja visto o que vem ocorrendo com o famigerado prêmio Mais Cultura Patativa do Assaré, onde fomos premiados há mais de um ano e até agora não vimos a sombra de um tostão. Vai ser preciso, como antes, arregaçar as mangas e correr atrás de patrocinadores para retirar essas obras do anominato.

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