segunda-feira, 13 de junho de 2011

Santo Antonio na Literatura de Cordel


O HOMEM QUE TEVE UMA QUESTÃO
COM SANTO ANTÔNIO

Hoje, dia 13 de junho, dia consagrado a Santo Antônio, resolvemos resgatar mais um cordel onde o Taumaturgo Português aparece como personagem central. Este folheto, atribuído a João Martins de Athayde, nesta edição cuja capa está retratada acima, vem a ser, na verdade de Antônio Ferreira da Cruz conforme atesta Leonardo Mota* e outros pesquisadores mais antigos. A obra do poeta Antônio da Cruz está praticamente esquecida porque muitos de seus folhetos foram publicados em Guarabira-PB, por Pedro Baptista e tiveram somente uma única edição. Daí que pouco se sabe sobre este vate sertanejo e menos ainda sobre a sua obra. É mais que oportuno o resgate desse folheto que apesar do sabor de ingenuidade, próprio do catolicismo arcaico do sertão nordestino, traz uma mensagem positiva no final.

Amava a sua mulher
E muito bem lhe queria
Principalmente ao filho
Que beijava todo dia
Também estimava muito
Um ‘quartau’ que possuía.

Amava sua mulher
E a seu filhinho inocente
E também a seu cavalo
Por achar muito decente
Pediu a Deus que seus trastes
Ficassem para semente.

Um dia estava dormindo
Quando despertou em sonho
Então uma voz lhe disse:
- Não é arte do demônio
Pra seus trastes não morrerem
Vai adorar Santo Antonio.

(...)

Quando foi no outro dia
Fizeram invocação
Trazendo aquele santo
Contrito no coração
Daquele dia em diante
Começaram a devoação.

Adoravam a Santo Antônio
Com toda força que tinha
Rezavam o padre-nosso
Também a Salve Rainha
Com muita jaculatória
Rezavam a ladainha.

Um dia estava dormindo
Acordou sobressaltado
Quando chegou na cocheira
Tava o cavalo laçado
Com a corda no pescoço
Tinha morrido enforcado.

Ele acordou a mulher
Lhe disse o que se passou
- Senhora, neste flagrante
Meu cavalo se enforcou
Pelo jeito que estou vendo
Santo Antônio me enganou.

Lhe respondeu a mulher
É tolo quem não conhece
As obras daquele Deus
Que todo mundo obedece
Antes morrer o cavalo
De que um de nós morresse.

Uma sucessão de desastres começa a acontecer, sem que a mulher jamais perca a fé em Santo Antonio. Morre seu filho adorado, lhe causando grande transtorno e em seguida, morre a própria mulher. O homem desesperado resolve suicidar-se:

Quando a mulher morreu
Só faltou enlouquecer
Pelas ruas da cidade
Não pretendia viver
O coração lhe pedia
Pra se enforcar e morrer.

Sepultou a sua esposa
E depois que se viu sozinho
Correu para uma mata
Depois saiu num caminho
Atrás dele vinha um homem
Montado em um burrinho.

Conheceu que era um padre
Olhou adiante e atrás
- Padre sempre dá conselho
Eu já sei padre o que faz
Se ele me aconselhar
Eu morro e não volto mais.

O padre falou pra ele
Com firmeza e energia:
- Filho para onde vais?
Vais a alguma romaria?
Ele aí torceu a cara
E lhe respondeu que ia.

O padre era Santo Antonio
Mas o homem não sabia
Quando viu o reverendo
Um mau juízo fazia
Dizendo eu vou pagar
Uma santa romaria.

O padre (Santo Antônio) insiste com ele e o homem acaba revelando que não tem mais fé em santo, pois adorou Santo Ant^nio para seus “trastes” não morrerem, entretanto sucedeu exatamente o contrário.  

O santo lhe respondeu
Para provar-lhe a razão
- Filho se vieres teus trastes
Diga se conhece ou não?
- Seu padre eu conheço tudo
Me dê a explicação.

Mostrou-lhe o padre um retrato
Com o cavalo selado
O cavalo estava em pé
O dono estava deitado
Tinha morrido de um coice
Que o animal tinha dado.

O homem então conheceu
Que o padre tinha bom tino
Era pela providência
Daquele Deus tão divino...
- Já que disse do cavalo
Diga também do menino.

Mostrou-lhe outro retrato
Com o menino retratado
Todo amarrado de cordas
Rodeado de soldado
E o pai, pertinho dele,
Triste para o outro lado.

- Teu filho com quinze anos
Roubava tudo que via
Era preso num flagrante
Trancado numa enxovia
Santo Antônio como bom santo
Matou, tirou da agonia.

- Seu padre suas palavras
É grande o valor que tem
Porque quando saem da boca
Os anjos dizem amém
Já que disse do menino.
Diga da mulher também.

Mostrou-lhe outro retrato
Provando a devassidão
A mulher em braços doutro
Com gosto e satisfação
Perguntou se era ele
Este respondeu que não.

O santo lhe explicou
Tudo que lhe aconteceu
- Porque a tua mulher
Com outro homem fugia
Ele como é bom santo
Matou, tirou d’agonia.

O padre o aconselha a volta para casa e adorar Santo Antonio. O homem baixa a cabeça e quando torna a olhar, padre e burrinho já haviam sumido. Ele compreende que estivera diante do próprio santo. Então:

Ele seguiu para casa
Fez nova invocação
Adorando a Santo Antônio
Contrito e de coração
Morreu com setenta anos
Quando teve a salvação.



ATENÇÃO!

* Eu imaginava ter visto essa informação sobre a autoria do poema no livro VIOLEIROS DO NORTE, de Leonardo Mota. Realmente o poema foi reproduzido nessa obra, mas Leota (como de costume) não diz o nome do autor. Fiquei imaginando que a fonte pudesse ser, talvez, Gustavo Barroso, mas ainda não tive como checar. De qualquer modo, prometo esclarecer este caso até o final da semana.
Segundo Sebastião Nunes Batista, em Antologia da Literatura de Cordel - 1ª edição, 1977, o folheto "O homem que teve uma questão com Santo Antônio" é mesmo da autoria de João Martins de Athayde. Vamos ficar, por enquanto, com a afirmação deste conceituado pesquisador, que muito se empenhou pela restituição de autoria na Literatura de Cordel.

3 comentários:

  1. Não gostei desses versos proucurava um que fala do santo antonio

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  2. A leitora Vitória procura, certamente, um folheto com a BIOGRAFIA de Santo Antônio. Não conheço nenhum... Geralmente Santo Antonio aparece em folhetos de "exemplo", como este ou mesmo em folhetos de "gracejo", como "A moça que pisou Santo Antonio num pilão", de José Costa Leite, ou "Santo Antonio responde a solteirona", de Bastinha. Sugiro pesquisar no acervo da Casa de Rui Barbosa:
    www.casaderuibarbosa.gov.br/cordel

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  3. Boa tarde,terminei de ler o livro vida e obra de Antônio cruz, e quis ler mas um cordel, vi achei o titulo, como gosto muito de santo Antônio, li e gostei. Obrigada por fazerem que está arte não ter fim. E termos esses tesouro em nossas terras.


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