quinta-feira, 18 de agosto de 2011

CORDEL NA ESCOLA

Projeto do escritor Arievaldo Viana encanta alunos do Norte ao Sudeste do Brasil

Por: Pedro Paulo Paulino*


A Literatura de Cordel está reconquistando seu espaço nos mais diversos setores, com visibilidade na mídia e reconhecimento nacional e até internacional. O sucesso que esse gênero de literatura popular está atingindo deve-se principalmente a um movimento de ressuscitação do Cordel empreendido por artistas talentosos e dedicados que não medem esforços para mostrar ao público o valor da arte nordestina. Percebendo que a poesia popular tem uma densidade muito forte, não só em sua vasta temática mas como tradutora e guardiã fiel da nossa cultura, o cordelista Arievaldo Viana Lima foi um dos pioneiros a levantar a bandeira de reabilitação do Cordel que a cada dia se torna mais à mostra na simpatia do público.

O seu trabalho mais recente introduz o Cordel em um setor bem especial: a educação. Segundo Ari, no passado os estudantes da zona rural tinham contato com a leitura unicamente através dos folhetos comprados nas feiras das pequenas cidades. “Minhas primeiras leituras foram os ‘versos’ que eu lia para mim e para uma platéia que vibrava com as histórias de amor, de bravura, de gracejo, dos melhores autores, como Leandro Gomes de Barros, João Martins de Athayde, José Pacheco e muitos outros”, diz Arievaldo, referindo-se à sua infância na Fazendo Ouro Preto, em Quixeramobim, Ceará.

Partindo dessa constatação, ele caiu em campo e produziu agora um dos melhores trabalhos didádicos sobre o tema, o livro “Acorda Cordel na Sala de Aula”, publicado em parceria pelas editoras Tupynanquim e Queima Bucha, lançado no dia 05 de maio no espaço da livraria Livro Técnico, no Centro Dragão do Mar de Fortaleza. O trabalho, segundo o autor, está direcionado especialmente aos estudantes, e pode ser utilizado como ferramenta paradidática na alfabetização de crianças, jovens e adultos, pois traz explicações claras a respeito das técnicas do Cordel, versificação, rima, métrica, estrofes, modalidades, origens do Cordel e exercícios e atividades escolares baseados nessa literatura. A obra, ricamente ilustrada com reprodução de capas dos folhetos e xilogravuras dos melhores mestres, traz também biografia e antologia dos autores mais consagrados do gênero. “As experiências obtidas em cidades como Campina Grande-PB, Palmas-TO e Canindé-CE nos autorizam a afirmar que a receptividade entre os alunos é excelente, sobretudo em atividades como leitura em grupo e elaboração de novos folhetos entre os próprios estudantes”, explica. O livro acompanha ainda uma caixa contendo 12 folhetos de vários autores, inclusive canindeenses como Gonzaga Vieira e o próprio Arievaldo. O autor informa que em Londrina-PR, o Cordel está sendo trabalhado há mais de um ano pela profª. Bruna Scrivanti e na cidade de Palmas-TO, vem tendo grande destaque graças ao prof. Milton Félix, que participou de oficina realizada em setembro do ano passado, naquela capital. O projeto ACORDA CORDEL já foi destaque na imprensa nacional, com reportagens nas revistas Época e Palavra. Ainda este mês, segundo Ari, a revista Nossa História deverá trazer uma matéria sobre o Projeto Acorda Cordel. O próximo lançamento do livro será no dia 09 de junho em Mossoró-RN, a convite da Sociedade Brasileira de Estudo do Cangaço (SBEC).


O BE-A-BÁ VERDADEIRO


Uma avaliação recente do Ministério da Educação e Cultura (MEC), sobre as metodologias de ensino adotadas nas escolas, chegou a uma conclusão: é preciso mudar. Atualmente, mais de 60% das escolas em várias partes do mundo, inclusive no Brasil, usa o método construtivista, criado pelo suíço Jean Piaget, no qual o professor mostra à criança um livro e a faz interessar-se pela história por meio de imagens. Ela é incentivada, inclusive, a adivinhar o enredo. Já pelo método fônico, o professor ensina o som de uma letra (B) e suas variações silábicas (BA, BE, BI, BO,BU). Pois agora o MEC reconhece que este é o método mais eficaz na alfabetização. Ora, através do método fônico um sem-número de gerações, inclusive a minha, alfabetizou-se, principalmente nas escolas informais da zona rural, pelas mãos da dedicada “professorinha que ensinou o bê-a-bá”, como disse Ataulfo Alves. E não resta dúvida que a alfabetização por meio desse método, além de direta, fixa muito mais a eufonia das palavras no ouvido do aluno, abrevia o aprendizado da leitura e ajuda a melhorar a ortografia, tão sofrível nos dias de hoje. Em nossas séries iniciais, numa dessas escolinhas domésticas do interior, aprendi, assim como o poeta Arievaldo, a ler e a escrever ouvindo e acompanhando a nossa mestra na soletração das palavras. Até mesmo uma cultura gráfica era desenvolvida naquele tipo de escola, pois se aprendia a rigor a desenhar cada letra - a mão da professora segurando a mão do aluno. Resultado era uma caligrafia artisticamente clara. Também meus primeiros livros foram os folhetos de Cordel, que os lia cheio de encantamento e expectativa. O Cordel estva atrelado à minha rotina escolar na infância. Era interessante, empolgava, remetia a temas épicos ou presentes no meu habitat. Era uma extensão da nossa cartilha. E talvez não é à toa que o seu formato padrão é o mesma da antiga Carta de ABC e da Tabuada na qual se aprendia aritmética e rudimentos da matemática. O escritor Arievaldo Viana teve um desses raros lampejos de inspiração ao conceber o Projeto Acorda Cordel na Sala de Aula. Seu trabalho é tão substancial e atraente que à primeira vista prende a atenção e o interesse do leitor, especialmente do aluno. Não pude esconder o contentamento quando chegou às minhas mãos o exemplar do seu livro Acorda Cordel. Ao mesmo tempo, senti um profundo pesar íntimo, pois gostaria de ter recebido o seu belo livro na minha infância, quando aluno da minha primeira professora, Susana Viana, na Escolinha Particular de Campos.



* Pedro Paulo Paulino, cearense de Canindé, é jornalista e poeta popular. (Artigo publicado no Jornal DE MÃO EM MÃO, edição nº 100)


O AUTOR


Arievaldo Viana Lima, poeta popular, radialista, ilustrador e publicitário, nasceu na Fazenda Ouro Preto, Quixeramobim-CE, em 08 de setembro de 1967. Em 1980 transferiu-se com a família para Canindé. Em 1999, em parceria com o poeta canindeense Pedro Paulo Paulino, lançou uma caixa com 10 títulos denominada Coleção Cancão de Fogo. É o criador do Projeto Acorda Cordel na Sala de Aula. Membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel, ocupa a cadeira nº 40. Em 2002 venceu o V Prêmio Domingos Olympio de Literatura (modalidade Cordel), da prefeitura de Sobral. Já lançou mais de 100 folhetos e tem mais de 10 livros publicados.

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