sexta-feira, 17 de junho de 2011

ESCLARECIMENTO OPORTUNO

 
LITERATURA DE CORDEL
E POESIA MATUTA

Num comentário que fez na postagem de ontem, o poeta Marco Haurélio citou um trecho do livro Autores de Cordel, de Marlyse Meyer, que traduz a exata dimensão do poeta de bancada, sempre sedento de conhecimento:

"De modo geral, os poetas procuram se informar de tudo. Leem, quando podem, e tentam possuir uma pequena biblioteca. É o caso de Manoel Camilo, possuidor de uma estante cheia de livros. É também característica do poeta popular uma verdadeira obsessão pelo aprimoramento da linguagem. Justamente por isto, não podem ser confundidos com os chamados poetas matutos, os quais deformam de propósito o idioma, com o intuito de recriar a linguagem do homem do campo, que acreditam errada."

É isso, meus senhores e senhoras. O cordel, desde os primórdios, desde a longínqua estréia de Leandro Gomes de Barros e Silvino Pirauá de Lima vem primando pela correção da linguagem. É inadmissível, portanto, que pessoas esclarecidas (inclusive pesquisadores renomados) confundam a verdadeira Literatura de Cordel com a poesia matuta. Nada contra a segunda, uma singela expressão da cultura popular, onde pontificaram nomes como Catulo da Paixão Cearense, Zé da Luz, Patativa do Assaré, Luiz Campos e Alberto Porfírio. Costumo dizer que as duas são ramos do mesmo tronco, filhas da mesma árvore - o TROVADORISMO -, mas que cada uma tem suas peculiaridades. Ou seja, são galhos bem distintos.

A verdade tem que ser esclarecida, para que os leitores hodiernos não continuem comprando gato por lebre.

Vejam abaixo trechos de um excelente cordel produzido pelo poeta cearense Pedro Paulo Paulino, publicado hoje no seu blog:  www.vilacamposonline.blogspot.com


O MEU CORDEL ENCANTADO
Pedro Paulo Paulino


O meu cordel encantado
Está na televisão
Que eu trago sintonizada
No canal do coração,
Desde as primeiras leituras,
Com as imagens mais puras
Das coisas do meu sertão.

O meu cordel encantado,
Eu sempre tenho assistido
No dia a dia do povo
Deste Nordeste sofrido:
Um cordel risonho e franco,
Umas vezes, preto e branco,
Outras vezes, colorido.

O meu cordel encantado,
Repleto de poesia,
Está lá numa escolinha
Onde aprendi certo dia
O á-bê-cê e a tabuada,
Sem qualquer norma empregada
Na atual pedagogia.

O meu cordel encantado
Inda está sobre o balcão
Da bodeguinha modesta
Do meu pai, lá no sertão,
Onde à tarde, sem faltar,
Lia para ele escutar
Versos sobre Lampião.

O meu cordel encantado
Inda está na poesia
Cativante do romance
Coco Verde e Melancia,
No Malazartes Jocoso,
No Pavão Misterioso,
Que também pra ele eu lia.

O meu cordel encantado
Que conservo sempre eterno,
Pela mão que o escreveu,
Já nasceu velho e moderno,
Com metro e rima apurada,
Tem como exemplo, A Chegada
De Lampião no Inferno.

O meu cordel encantado
Tem bastante sensação,
Faz rir, como faz chorar,
Se lido com emoção.
O meu cordel tem sinônimo
Na história de Jerônimo
- O Grande Herói do Sertão.

O meu cordel encantado
Tem sentido e tem roteiro.
Grinalra e Sebastião,
Um romance verdadeiro.
Com saudade, sinto abalo
Ao lembrar certo cavalo
Que defecava dinheiro.

O meu cordel encantado
Eu lembro a todo momento.
Pela grandeza que tem,
Contagia o sentimento,
É feito com perfeição,
Como A Vida de Cancão.
E seu rico Testamento.

O meu cordel encantado
Que eu lia na infância minha
Era o mesmo que se lia
Numa casa de farinha,
Romance de drama e glória,
Tal como a bonita história
Do Pedrinho e a Julinha.

(...)


Ver postagem integral em:  http://www.vilacamposonline.blogspot.com/

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4 comentários:

  1. Sem querer polemizar diria que há exceções, belíssimos poemas em linguagem matuta. como negar a belza de Ingém de Ferro? Logicamente que em toda arte há impostores, que são devidamente filtrados pela peneira implacável do tempo e tendo a mesma posteridade, em outro campo, que os menudos, os tremendos, alguém ainda se alembra?

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  2. De fato, a beleza de alguns poemas 'matutos' é inegável. Como não rir de uma poema como "Me enganei com minha noiva", do mestre Luiz Campos? Como não se comover diante de uma declamação bem feita de "Carta a Papai Noel", do mesmo autor? Entretanto existe mais caroço debaixo desse angu. Patativa, por exemplo, não gostava de ser chamado de "cordelista". Segundo ele, os cordelistas não passavam de simples versejadores enquanto ele, Patativa, era POETA.
    Realmente o tempo se encarega de peneirar os impostores, mas isso às vezes demora muito... Alberto Porfírio, grande poeta, morreu sem o reconhecimento devido, à altura de seu talento, enquanto uma penca de pseudo-poetas publicam pelas maiores editoras do país.

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  3. Bem lembrado, é inexplicável esse silêncio em torno de Alberto Porfírio, injusto, sem dúvida. Faltou autopromoção...

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