LITERATURA E
RESISTÊNCIA
Poeta de cordel diz que as
oligarquias são 'o grande câncer' do país
Com 30 títulos
publicados e 100 mil exemplares vendidos, escritor paraibano lança clássico
"Menino de Engenho" em versos de cordel, e defende expressão cultural
como frente de luta pela libertação
por Helder Lima, da RBA
Poeta Janduhi Dantas, foto: Divulgação
São Paulo – Obra
clássica da literatura brasileira, o romance Menino de Engenho, de José Lins do
Rego (1901-1957), foi recriado em versos de cordel e publicado em edição
produzida com recursos próprios pelo escritor paraibano Janduhi Dantas, um dos
principais nomes da literatura cordelista hoje no Nordeste. “Passei mais de um
ano no texto. Havia momentos de felicidade, em que o texto fluía e agradava,
dava prazer, até mesmo emocionava. Mas tinha em que dava trabalho achar as
palavras para as quais houvesse rima e métrica. Dava trabalho, dava dor de
cabeça. Tinha que ter paciência”, afirma Janduhi.
O escritor, professor
e pesquisador da cultura brasileira tem no currículo duas edições paradidáticas
publicadas pela Editora Vozes: As figuras de linguagem na linguagem do Cordel e
Lições de Gramática em Versos de Cordel. Ambas mostram a versatilidade da
linguagem do cordel para discorrer sobre os mais diversos temas e assuntos, e
são também emblemáticas da valorização que essa expressão cultural pode
alcançar em obras de interesse a um grande universo de leitores.
Com cerca de 30
histórias publicadas e 100 mil exemplares vendidos, Janduhi, que vive em
Juazeirinho, no Seridó paraibano, a 190 quilômetros de João Pessoa, tem a maior
parte de seus títulos encontrada no comércio turístico da capital do estado e
de outras cidades nordestinas que se identificam com a literatura de cordel.
Seu título A mulher
que vendeu o marido por R$ 1,99, como ele próprio diz “um de meus dois
trabalhos mais conhecidos”, alcançou a tiragem de 20 mil exemplares e foi
referência em um artigo do jornalista Xico Sá em janeiro de 2012: “Na sua
crônica de costumes sobre o avanço das mulheres, o poeta conta como uma
destemida fêmea resolveu se livrar do seu ébrio e desagradável companheiro, no
ano de 2010. A heroína, que no cordel é comparada a Leila Diniz, levou a
infeliz criatura à feira e o vendeu a uma velha senhora.”
Como escritor
consciente de que não é possível ficar à margem da política, Janduhi vê na
persistência da dualidade entre Casa-Grande e Senzala na cultura um dos
principais problemas que seguram os avanços em direção a uma sociedade
inclusiva. “Penso que sim, que a dicotomia Casa-Grande e Senzala persiste.
Penso que o grande câncer do país são as oligarquias. Penso que não conseguimos
superá-las, vencê-las ainda. Penso que com oligarquia não dá para ser feliz! As
oligarquias são a Casa-Grande do país”, afirma nesta entrevista à Revista do
Brasil.
“Particularmente, me
motivam as palavras do teatrólogo Plínio Marcos, que dizia que ‘um povo que não
ama e preserva suas formas de expressão mais autênticas jamais será um povo
livre’. Então estou preocupado com a identidade cultural de meu povo”, afirma
ainda Janduhi, que agora trabalha na adaptação de um clássico do cinema para o
cordel, mas ainda guarda o projeto em segredo.
Por que a escolha de
Menino de Engenho para recriação na literatura de cordel? O fato de José Lins
do Rego ser paraibano pesou em sua escolha? Ou foram os 60 anos da morte do
escritor?
Não necessariamente
foi isso. Foi mais pelo grande carinho que tenho pelo livro. E sei que muita
gente também tem esse carinho. Foi um dos primeiros livros que li, adolescente;
lembro-me da emoção que me deu a sua leitura. Ainda hoje é para mim um livro
emocionante. Foi a minha descoberta de Zé Lins. Depois dele, fui ler Doidinho,
Banguê, o lindíssimo Pureza, até chegar a (que não tenho como ler sem não
chorar!) Fogo Morto, que está entre os 10 mais importantes romances da
literatura brasileira. Coincidência talvez tenha sido a de estar a obra de Zé
Lins tão influenciada pela poesia popular de sua terra. Ele certa vez disse que
Os doze pares de França, obra basilar para a Literatura de Cordel, foi o
primeiro livro que leu, aos 10 anos. E em outra ocasião disse que “quando
imagino os meus romances, tomo sempre como roteiro e modo de orientação o dizer
as coisas como elas me surgem na memória, com o jeito e as maneiras simples dos
cegos poetas”. Eu tinha feito a adaptação de um conto de Leon Tolstoy para o
cordel há pouco tempo, e um dia deparei com o Menino de Engenho na estante e
foi aí que veio a ideia da transcrição.
Menino de Engenho foi
o primeiro livro publicado por José Lins do Rego, em 1932. Curiosamente, o
romance foi publicado com os próprios recursos do autor, que depois teve uma
carreira promissora como escritor. E agora, 85 anos depois, você publica a
versão em cordel, também com os próprios recursos, em versão de autor. Essa
coincidência significa que alguma coisa não muda neste país?
Na verdade, por um bom
tempo, há uns cinco anos, este cordel esteve para ser publicado pela Editora da
Universidade Estadual da Paraíba (EDUEPB). Mas era muito grande o número de
livros a serem publicados por aquela editora na época, e o cordel acabou não
saindo por lá. Com toda dificuldade enfrentada, como escassez de verba para
tocar os trabalhos, a direção da EDUEPB já há um bom tempo vem fazendo um
trabalho muito bonito, publicando não só professores da universidade, como
também escritores diversos da Paraíba, por meio do selo Latus. Tenho publicado
por ela adaptação de um conto de Tolstoi, adaptação de Psicose, de Hitchcock, e
um cordel que aborda a Revolta de Princesa, estopim da Revolução de 30 em João
Pessoa. A editora é, inclusive, ganhadora já de alguns prêmios Jabuti. De
qualquer modo, optei pela edição independe do cordel, esperando ver a
repercussão do lançamento, para depois ver a possibilidade de nova edição por
alguma editora. Por sorte, os autores de cordel conseguem ser mais autônomos
(também politicamente), até mesmo pelo custo baixo da edição de um cordel. O
baixo custo da impressão de um cordel facilita a sua venda.
Qual foi o principal
desafio para transpor Menino de Engenho para o cordel? Quanto tempo você
trabalhou nesse projeto?
O que fiz, na verdade,
foi tentar dizer em versos o que Zé Lins diz em prosa. Como o texto original é
escrito em primeira pessoa, não achei que seria fácil passá-lo para o cordel em
terceira pessoa, por exemplo. Achei que isso poderia descaracterizar por demais
o original. E assim fui, página por página, sintetizando em versos o que lia,
sem perder de vista a necessidade de dar coerência ao texto. Outro dia na TV vi
um documentário em que o diretor do clássico Doze homens e uma sentença dizia
algo como “a gente se emociona com o que faz antes de emocionar o nosso
público”. Me lembrei do processo da escrita do cordel. Passei mais de um ano no
texto. Havia momentos de felicidade, em que o texto fluía e agradava, dava
prazer, até mesmo emocionava. Mas também havia hora em que dava trabalho achar as
palavras para as quais houvesse rima e métrica. Dava trabalho, dava dor de
cabeça. Tinha que ter paciência.
Onde já foi lançado
Menino de Engenho em versos de cordel? Como faz o leitor de qualquer lugar do
país que quiser adquirir um exemplar?
O cordel está sendo
lançado em algumas cidades da Paraíba. O primeiro lançamento foi em João
Pessoa, no Espaço Cultural José Lins do Rego, onde recebi importante apoio do
pessoal que administra o Museu Zé Lins que, além de me convidar para fazer o
lançamento lá, dentro das comemorações da “Semana José Lins do Rego”, me fez
chegar até uma das filhas do escritor. Na conversa (para mim, uma emoção falar
com uma filha de Zé Lins!) que tive com essa filha dele, a dona Cristina, fui
informado que os direitos autorais das obras do pai dela pertencem à Editora
Record. Posteriormente, tive dessa editora a autorização para publicar o
cordel. Tudo isso porque a obra original não está em domínio público. O
“cordelivro”, como alguns chamam o cordel no formato de um livro, também foi
lançado em Pilar, terra de Zé Lins, e Teixeira. Ainda será lançado em Patos,
minha cidade natal, e Sousa, no Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBNB). E
estamos vendo um lançamento para Natal ainda este ano. As pessoas que queiram
adquirir o livro podem fazê-lo pelo meu email: durica5164@gmail.com. Antes que
esqueça: há no Youtube pequeno vídeo em que divulgo o cordel: Menino de Engenho
em cordel.
VER POSTAGEM COMPLETA
AQUI:
http://www.redebrasilatual.com.br/revistas/130/poeta-de-cordel-diz-que-as-oligarquias-sao-o-grande-cancer-do-pais
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