O HOMEM QUE QUERIA ENGANAR A MORTE
Um cordel de ARIEVALDO VIANNA
Diz um
antigo provérbio
Que a morte
ninguém desvia
Até mesmo
Salomão
Com sua
sabedoria
Quis mudar o
seu destino
Mas o
desígnio divino
Tal coisa
não consentia.
Tentar mudar
o destino
Que nos
traça o Soberano
Mostrou-se,
através dos tempos,
O mais
lamentável engano
Todo homem,
quando nasce
A Morte
grava-lhe a face
Com a marca
do desengano.
Ceifar da
face da terra
Todo e
qualquer ser vivente
É esta a sua
missão
Imutável,
permanente,
Tentar
enganar a Morte
É pelejar
contra a sorte
Numa luta inconseqüente.
Manter gelo
no sol quente
Sem ter
refrigerador
É querer
guardar dinheiro
Depois que
perde o valor;
Renegar o
Evangelho,
Viajar num
carro velho
Depois que
bate o motor.
Num pequeno
vilarejo
Encravado no
agreste
Residia um
potentado
O mais rico
do Nordeste
Fazendeiro
respeitado
Dono de ouro
e de gado
Sovina que
só a peste.
Construiu
bela mansão
Bem na rua
principal
Mandou
cercá-la de grades
Botou um
guarda leal;
Entretanto,
bem pertinho
Residia um
pobrezinho
Numa miséria
total.
Era um
casebre de taipa
De palha e
zinco coberto
Em um
terreno baldio
Que antes
era deserto
E o coitado
ali vivia
Porque o
dono consentia
Ou não
sabia, decerto...
(...)
Lá na mansão
do ricaço
Uma bela
placa havia
Dizendo o
nome da rua
“Desembargador
Garcia”
O número
vinha depois:
Seiscentos e
vinte e dois
Na mesma
placa se lia.
Era uma
placa dourada
Toda em
metal niquelado
Os números
de outra cor
Feitos de
bronze cromado;
Agora vamos
saber
Que placa
podia haver
No casebre
do outro lado.
Num pequeno
compensado
Ou talvez
num papelão
O pobre
havia botado
Um texto
feito a carvão
“Seiscentos
e vinte três”
Agora vejam
vocês
O deus
Destino em ação...
Certo dia o
rico andava
Nas ruas da
capital
Quando uma
velha cigana
Revela seu
mapa astral:
- Nos
corredores da sorte
Eu vejo a
face da morte
Numa
sentença fatal.
Dizia a
velha: — Estou vendo
(Pois já se
aproxima o dia)
A morte
andando na rua
“Desembargador
Garcia”
E numa bela
morada
Que tem a
placa dourada
Vejo prantos
de agonia.
O rico
impressionado
Com os pés
cravados no chão
Viu na bola
de cristal
Reflexos de
uma mansão
Idêntica à
que residia
E a dita
placa onde lia
O número com
perfeição.
Viu uma
mulher chegar
Montando um
negro corcel
Consultando
um velho livro
Cessou então
o tropel
Do seu
cavalo e parou
A dita placa
mirou
E anotou num
papel.
O rico saiu
dali
Bastante
impressionado
As palavras
da cigana
O deixaram
perturbado,
Dia e noite
lamentava
Porque já se
aproximava
A triste
data marcada.
(...)
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