domingo, 6 de maio de 2018

MESTRE DA CULTURA




Hoje, 06 de maio, é o aniversário do poeta João Lucas Evangelista, Mestre da Cultura do Ceará:

De JOÃO GRILO e de CANCÃO
O poeta herdou a manha
A defesa do CORDEL
Foi sempre sua campanha
Sem jamais sair da pista
JOÃO LUCAS EVANGELISTA
MENESTREL DA CALAMBANHA.



Fotos: Arusha Oliveira


LUCAS EVANGELISTA,
O MENESTREL DO REINO DA CALAMBANHA*

“No castelo das pedras sertanejas
Brilha o sonho do povo brasileiro.”
(Ariano Suassuna)

Saímos bem cedo de Fortaleza, eu e meus compadres Stélio Torquato Lima e Arusha Oliveira, seguimos pela BR 0-20 até Canindé e de lá tomamos o rumo de Santa Quitéria, Hidrolândia, Ipueiras e Crateús, munidos de gravadores, filmadoras e câmeras fotográficas. O objetivo era entrevistar o Fabuloso Menestrel do Reino da Calambanha em seu habitat natural.
Se o leitor ainda não sabe quem é o misterioso personagem em questão, trata-se do autor das consagradas canções “Carta de um marginal” e “Tostão de Chuva”, ninguém menos que o velho bardo João Lucas Evangelista. Nascido no ano da graça de 1937, Lucas Evangelista teve a sorte de nascer cearense porque, no século XIX, o nosso Estado resolveu permutar a belíssima Parnaíba, com seu delta exuberante e clima agradável, pela aridez e o calor de Crateús. Se não foi uma boa troca, pelo menos ganhamos um poeta. Fizemos essa pitoresca viagem no “Astronauta Libertário”, um velho carango que meu compadre Stélio mimava com chistes e agrados. Até instalara um aparelho de tocar CD's, razão pela qual a viagem de ida foi embalada por canções de Roberto Carlos e Belchior.



Stélio Torquato, Lucas Evangelista, Arievaldo Viana, Raimundo Cândido e 
o poeta Humberto Paz, membros da Academia de Letras de Crateús-CE.


Como diz a “Canção de Gesta” de Jorge Mello e Belchior, enquanto o som do alto falante rolava e me dava o toque, fui relembrando o início de minha amizade com esse trovador eletrônico chamado Lucas Evangelista. Acompanho o seu trabalho com bastante interesse, desde a época em que o conheci nos festejos religiosos da cidade de Canindé-CE, no comecinho da década de 1980. Ali o poeta comparecia duas vezes por ano, na Festa de São Francisco e no Natal, vendendo folhetos, discos e fitas K7 contendo a sua inspirada produção poética. As canções "Filho de cigano" e "Veniz, o cão de guarda" são as minhas preferidas, embora seu maior êxito nessa seara ainda seja "Carta de um marginal". Dos romances publicados em folheto gosto de "As aventuras de João Desmantelado", publicado pela Editora Luzeiro e "Lucilane, o vaqueiro valente nas vaquejadas do céu", este último um clássico do gênero. Foi Lucas que, de certa forma, me estimulou a publicar meus primeiros folhetos. Por volta de 1997, encontrei o poeta novamente em Canindé, porém bastante desanimado em relação ao futuro da Literatura de Cordel. Disse-me que as principais editoras estavam fechando e que não havia uma nova geração para dar continuidade à tradição. Isso serviu-me de alerta para iniciar uma "campanha" em prol da revitalização do cordel.
Seguramente, minha conversa com Lucas Evangelista em 1997, sobre a situação em que se encontrava o cordel, mais precisamente o folheto, o suporte tradicional da poesia popular, foi o fator determinante para que, a partir de então, eu abraçasse a cruzada de difundir e revitalizar essa arte pelos quatro cantos do país.
Chegamos em Crateús por volta do meio dia e já éramos esperados pelo velho bardo que, juntamente com o escritor Raimundo Cândido, nos levaram até os estúdios da rádio Educadora, onde participamos de uma animada entrevista. Em seguida, fomos recepcionados por membros da Academia de Letras de Crateús, cuja sede funciona na antiga estação ferroviária. Foi ali, cercados por livros, folhetos e homens de letras, que ligamos o nosso equipamento para colher o depoimento de Lucas Evangelista e outros poetas da região. Foi uma conversa longa, reveladora e bem descontraída, mas ao concluir a entrevista me parecia haver faltado algum elemento, algum ingrediente picaresco, já que Lucas Evangelista é um verdadeiro Cancão de Fogo, um amarelinho muito do sabido, como seu xará João Grilo e o irrequieto Pedro Malazartes. Por sinal, seu único irmão chamava-se Pedro, razão pela qual o velho editor Joaquim Batista de Sena os identificava com esses personagens do cordel. Disse-me o Lucas que certa feita eles saíram com duas malas de folhetos para o Mercado São Sebastião, em Fortaleza, quando a esposa de Joaquim Batista de Sena se mostrou preocupada:
— Hein, Joaquim... Você mandou os meninos para o mercado, com essas malas de folhetos e eu acabei de ouvir aqui no rádio que houve uma fuga no presídio e que os ladrões, possivelmente, já se encontram aqui em Fortaleza. E agora?
Sena começou a rir e tranquilizou a esposa desse modo:
— Ora, minha velha, os ladrões é que devem tomar cuidado com os Evangelistas!

(...)

* Trecho extraído do livro NO TEMPO DA LAMPARINA, de Arievaldo Vianna. Lançamento em breve!



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