domingo, 19 de fevereiro de 2017

FOLHETOS DE GRACEJO




O CORDEL TIRANDO A MULHER A TERREIRO
(As feministas que me perdoem, mas a piada é fundamental)

“A mulher numa algibeira
Chama-se tiro seguro,
Porque ela entra n'um bolso
Que só fogo no monturo,
Como faca em melancia
 colher em mamão maduro.”

(Leandro Gomes de Barros -  O casamento do velho
e um desastre na festa, folheto de 1913)

A mulher, eterna musa dos poetas, razão maior da existência da poesia é decantada em milhares de folhetos da Literatura de Cordel. Segundo o saudoso poeta paraibano Manoel Monteiro, “a poesia popular vem de tempos  imemoriais, dos beduínos nômades, dos mouros, dos ciganos avoengos, de andarilhos errantes que para afugentar a solidão do ermo cantavam para as estrelas da Península Ibérica, espraiando-se depois pelas terras do Novo Mundo.”
Pelo menos é o que dizem os estudiosos da poesia popular, mas o poeta Manoel Monteiro achava que a coisa vinha de muito mais longe. Segundo ele, “a poesia nasceu na caverna quando o macaco em mutação, já mais homem do que símio, querendo fazer a côrte  à trogloditazinha simpática, cantou-lhe o primeiro verso e com esse artifício meloso ganhou a primeira mina.”


O grande poeta Manoel Monteiro, já falecido.

São inúmeros os poemas enaltecendo a graça e a beleza da mulher, mas, como não poderia deixar de ser, existem também centenas deles  “tirando a mulher a terreiro”, ou seja, levando-a para o campo do gracejo e do humorismo. Citamos como exemplo: O gênio das mulheres, O peso de uma mulher e A mulher em tempo de crise, de Leandro Gomes de Barros. José Pacheco da Rocha, o genial poeta alagoano, também escreveu um folheto intitulado A mulher no lugar do homem, no qual ridiculariza as conquistas feministas. O já mencionado Manoel Monteiro, de Campina Grande-PB, lançou há pouco tempo um folheto na mesma linha de Pacheco intitulado A mulher de antigamente e a mulher de hoje em dia, do qual reproduziremos alguns trechos:

Folheto de gracejo escrito por José Costa Leite


A MULHER DE ANTIGAMENTE
E A MULHER DE HOJE EM DIA
Autor: Manoel Monteiro
(Membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel)

Deus após formar o mundo
Achou que era preciso
Povoá-lo, fez Adão,
Mas fez Eva sem juízo
E deixou os dois flertando
No pomar do Paraíso...

Quando foi criar o homem
Ficou sobrando um pedaço,
Ele deixou assim mesmo
E seguiu sem embaraço
Mas quando fez a mulher
Deixou aberto um espaço.

Adão ficou perturbado
Vendo um defeito daquele,
Pois o que faltava nela
Estava sobrando nele,
Para tapar o buraco
Meteu o pedaço dele.


Eu acho que a Bíblia fala
Em sentido figurado,
Porque deixar Adão nu,
Com Eva nua a seu lado
Tinha que dar no que deu:
Foi Caim pra todo lado!

Você já imaginou
Eva dengosa e faceira
Tendo só por vestimenta
Uma folha de parreira?
Não precisava nem Cão
Para Adão fazer besteira.

Mas no começo do mundo
Tudo era diferente
Trabalhar não precisava
Adão vivia contente,
Só arruinou, ao juntar-se
Eva, a maçã e a serpente.

Porque Deus disse à Adão
Como de tudo, porém,
Não coma a maçã de Eva,
Adão lhe disse: Está bem!
Mas veio a peste da cobra
Pra estragar seu xerém.

Contra as ordens do Divino
A cobra se levantou,
Tentou o primeiro homem
E Adão se abestalhou
Comeu a maçã de Eva
E o negócio arruinou.

O homem foi enganado
Por Eva e por Lúcifer
Mas ele em sua bondade
Dá tanta corda à mulher
Que ela pensa que pode
Fazer o que bem quiser.

Elas estão todo dia
Tomando o nosso lugar
Se continuarem assim
Só o que nos vai sobrar
É o tanque de lavar roupa
E o ferro de engomar.

Em toda repartição
Tem uma mulher mandando
Elas estão assumindo
Todos os postos de mando
E enquanto isso no lar
Tem uma mulher faltando.

(...)

Houve um tempo que a mulher
Era bicho conhecido
Usava saia godê
Blusa de manga ou vestido
Anágua, friso e marrafa
Cabelo sempre comprido.

Touca, espartilho, ampoleta,
Moda ousada era cocó
Se o rapaz pedisse um beijo
Ficava falando só
Sem casar, só via mesmo
Mão, pescoço e mocotó.

Não raspava a sobrancelha
Nem sovaco, nem pentelho,
Para usar rouge ou batom
Tinha que pedir conselho,
Califon de meio corpo,
Calçola até o joelho.

A mulher andava livre
Do terreiro pra cozinha,
No resto era proibida
Na sala a mulher só vinha
Se fosse pra trazer água
Ou para tanger galinha.

No jornal O Povo, edição de 25/05/2003, na página 8 do caderno Allmanaque, foi publicado um e-mail enviado pelo leitor Bruno Loureiro, intitulado “As feministas que me perdoem, mas a piada é fundamental”, onde figura esse trecho da Constituição Nacional Inglesa (lei do Século XVIII)  “Todas as mulheres que seduzirem e levarem ao casamento os súditos de Sua Majestade mediante o uso de perfumes, pinturas, dentes postiços, perucas e recheio nos quadris, incorrem no delito de bruxaria, e o casamento fica automaticamente anulado.”
Os editores do referido caderno, não resistiram à tentação e publicaram o seguinte comentário: “Para sorte da mulher inglesa, a Constituição se esqueceu de prever avanços como o silicone, o mega-hair, a lente de contato colorida, o wonderbra, a chapinha, os bobs, a maquiagem definitiva, a depilação e o curvex.”



A Literatura de Cordel, que tem eternizado o amor e a mulher  em romances clássicos como Coco Verde e Melancia, Pavão Misterioso, Pedrinho e Julinha (todos de José Camelo de Melo Resende) também não a poupa de gracejos. No Acre existiu um poeta chamado Manoel Lourenço Alves, descendente de cearenses, que publicou alguns folhetos, dentre os quais um de título bastante sugestivo: “Como escolher entre mil moças a que serve para o lar”. Nesse livreto o poeta diz o seguinte:

Vou escolher entre louras
Morena, branca e mulata,
Pequenas, grandes e médias,
Saber quem não é ingrata
E dizer quem é que tem
O coração de barata.

O rapaz pra se casar
É preciso ter coragem
Porque as moças de hoje
Eu não conto pabulagem;
Vou escolher entre mil
Pra saber a porcentagem.

Não pense que é brincadeira
O meu recenseamento
Porque nesta minha escolha
Noventa e nove por cento
Das moças classificadas
Quem dá o preço é o vento.

(...)

Quem se casar com uma moça
Que tenha a canela fina
Não sabe o que é prazer
Nem tem proteção divina;
É pior que jararaca
E ainda quer ser granfina.

Mulher da canela fina
Toda ela é faladeira
E é metida a valente
Gosta de ser fuxiqueira
Aonde passa uma dessas
Só se escuta a quebradeira.

Comecei falar em perna
Vou com o assunto a frente
Vou falar de perna grossa
Aí é mais diferente
Perna grossa e mini-saia
Faz admirar a gente.

Mas moça da perna grossa
Não dá conta do recado
Põe o feijão na panela
E deixa o fogo apagado
E dorme, que deixa até
O povo desconfiado.

E quando ela se acorda
Vai se queixar pra vizinha
- Mulher, eu tenho um feijão
Que o danado não cozinha...
Já este seu ferve logo
Não sei que sorte esta minha.

(...)

Mas se as moças tivessem
Algum letreiro na testa
No meu casório eu faria
O maior dia de festa
E não me importo que digam
LOURENÇO ALVES não presta.

Arievaldo Vianna

Trecho do livro MALA DA COBRA – ALMANAQUE MATUTO

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