FOLHAS VOLANTES E BENDITOS
NA LITERATURA DE CORDEL NORDESTINA
Por: Arievaldo Viana
Bendito de Jesus no Horto - xilogravura de Stênio Diniz
(Coleção particular de Arievaldo Viana)
Na Literatura de Cordel de outros países como Portugal, Itália, França, México, Chile, Espanha e Nicarágua predominaram as chamadas folhas volantes (pliegos sueltos), alguns em versos, outros em prosa, tratando dos mais variados assuntos. Os corridos mexicanos, por exemplo, tratam, em geral, dos mesmos assuntos abordados pelo cordel brasileiro: tragédias, feitos heróicos, brigas de genros e sogras, peripécias de cachaceiros, fenômenos sobrenaturais etc. A mesma coisa acontece com a Lyra Popular chilena, onde se encontra, inclusive, uma xilogravura idêntica a que surgiu em Juazeiro do Norte-CE. Na Literatura de Cordel portuguesa pontificam temas que foram reaproveitados no Nordeste, tais como: Imperatriz Porcina, Pedro Sem (no Brasil, Pedro Cem), Joana D’Arc, Carlos Magno e os Pares de França, João de Calais, José do Telhado e muitos outros.
Vida de Pedro Sem - Coleção da Biblioteca José Pacheco Pereira
No Nordeste brasileiro adotou-se uma forma fixa para o cordel, folhetos múltiplos de oito páginas, a saber: 8, 16, 24, 32 até 64 páginas. João Martins de Athayde, o maior editor do gênero no Brasil, resolveu partir as grandes histórias em dois volumes de 32 páginas, estratégia inteligente para obrigar ao leitor que teve acesso ao primeiro volume procurar o folheteiro para adquirir o segundo. Mas no cordel nordestino também circularam as chamadas folhas volantes e um rico novenário impresso no mesmo formato dos folhetos. Poetas como Eliseu Ventania, Apolônio Cardoso e Pedro Bandeira publicaram no século passado centenas e centenas de folhas soltas contendo a letra de suas canções. Abaixo, mostro exemplo de algumas dessas folhas, inclusive o célebre poema “Pau-de-arara do Norte”, da autoria de Patativa do Assaré, rebatizado por Luiz Gonzaga com o título de “A triste partida”.
"Pau-de-arara do Norte" - Folha volante de Patativa do Assaré
LIRA POPULAR CHILENA
Contrapunto entre el despachero e el tomador (Discussão do bodegueiro e o cachaceiro)
É incrível a semelhança da poesia popular chilena com a Literatura de Cordel brasileira, tanto nos temas, quanto nas gravuras que ilustram os poemas. A diferença consiste no fato da poesia nordestina haver evoluído na forma, nas modalidades e até mesmo na feição gráfica dos folhetos. No Chile, como no México, predominavam as FOLHAS VOLANTES (Corridos ou Pliegos Sueltos).
O poema acima, que trata da discussão de um cachaceiro com o bodegueiro, é todo elaborado em décimas, por José Hypólito Cordero, um dos maiores expoentes da Lira Popular Chilena.
O poema acima, que trata da discussão de um cachaceiro com o bodegueiro, é todo elaborado em décimas, por José Hypólito Cordero, um dos maiores expoentes da Lira Popular Chilena.
CORRIDOS MEXICANOS
Os corridos mexicanos, que também circularam em folhas volantes no final do século XIX e início do século XX aprsentavam as belíssimas gravuras do artista popular José Guadalupe Posada. No México, essa literatura é supervalorizada. Em viagem que fez àquele país, o poeta cearense Klévisson Viana adquiriu nada menos que 5 álbuns com corridos e gravuras de Posada, quase todos em capa dura e edição luxuosa, em papel de primeira qualidade.
INFLUÊNCIAS IBÉRICAS NO CORDEL NORDESTINO
Há uma tendência, da parte de alguns pesquisadores, em apresentar a Literatura de Cordel como uma expressão genuinamente nordestina, negando ou reduzindo as influências que recebemos dos nossos colonizadores. Realmente o Romanceiro Popular Nordestino é o mais rico, o mais vasto, superando os demais em quantidade e qualidade poética. Leandro Gomes de Barros, Chagas Batista, Silvino Pirauá, João Melchíades Ferreira, José Pacheco, José Camelo de Melo e outros pioneiros deram uma feição nordestina ao cordel brasileiro introduzindo a gesta do gado, o cangaceiro, os beatos e as histórias de valentões, como O valente Zé Garcia que, na opinião de Câmara Cascudo (em Vaqueiros e Cantadores), é um dos melhores do gênero. Segundo o grande folclorista potiguar, essa obra "retrata deliciosamente o sertão de outrora, com as pegas de barbatão, escolhas de cavalos para montar, rapto de moças, assaltos de cangaceiros, chefes onipotentes e vaqueiros afoitos, cantadores famosos e passagens românticas. Pertence bem ao ciclo social que terminou no século XX e que durara o século XIX."
No entanto não podemos negar que bebemos bastante na fonte européia e também na tradição árabe ao mergulharmos nas histórias medievais, com fadas, reis e princesas, gênios, ogros e duendes. Os contos de fada e 'As mil e uma noites' permanecem como fontes inesgotáveis de inspiração para todos os amantes do verdadeiro cordel.
Há uma tendência, da parte de alguns pesquisadores, em apresentar a Literatura de Cordel como uma expressão genuinamente nordestina, negando ou reduzindo as influências que recebemos dos nossos colonizadores. Realmente o Romanceiro Popular Nordestino é o mais rico, o mais vasto, superando os demais em quantidade e qualidade poética. Leandro Gomes de Barros, Chagas Batista, Silvino Pirauá, João Melchíades Ferreira, José Pacheco, José Camelo de Melo e outros pioneiros deram uma feição nordestina ao cordel brasileiro introduzindo a gesta do gado, o cangaceiro, os beatos e as histórias de valentões, como O valente Zé Garcia que, na opinião de Câmara Cascudo (em Vaqueiros e Cantadores), é um dos melhores do gênero. Segundo o grande folclorista potiguar, essa obra "retrata deliciosamente o sertão de outrora, com as pegas de barbatão, escolhas de cavalos para montar, rapto de moças, assaltos de cangaceiros, chefes onipotentes e vaqueiros afoitos, cantadores famosos e passagens românticas. Pertence bem ao ciclo social que terminou no século XX e que durara o século XIX."
No entanto não podemos negar que bebemos bastante na fonte européia e também na tradição árabe ao mergulharmos nas histórias medievais, com fadas, reis e princesas, gênios, ogros e duendes. Os contos de fada e 'As mil e uma noites' permanecem como fontes inesgotáveis de inspiração para todos os amantes do verdadeiro cordel.
Querido Arievaldo,
ResponderExcluirPARABÉNS pela excelente postagem: uma verdadeira aula para todos nós, pesquisadores da literatura popular. Estou preparando uma memória sobre Patativa do Assaré, quando fizer a postagem no Cordel de Saia te aviso.
Bjs,
rosário
Isso que é conteúdo...não apenas arte, mas também história!
ResponderExcluir[]s
As diferenças entre o cordel nordestinos e a poesia dita popular de outros países estão bem estabelecidas. É preciso buscar, portanto, os pontos de aproximação. Os romances peninsulares, os contos tradicionais e os livros do povo (definição de Teófilo Braga, não de Câmara Cascudo) são alguns destes pontos. Em nenhum lugar se trabalhou a matéria tradicional como no Brasil. Esse é, a meu ver, nosso grande diferencial, o que torna o nosso cordel único.
ResponderExcluirRealmente, Marco, é preciso identificar os pontos de convergência da nossa literatura de cordel com a poesia popular européia, tendo sempre a consciência de que aqui no Brasil ela se desenvolveu prodigiosamente, criou novas modalidades e abordou temas 'nunca dantes navegados' pelos nossos colonizadores. O trava-linguas, por exemplo, é invenção de Firmino Teixeira do Amaral, autor da excelente peleja de Cego Aderaldo com Zé Pretinho. Na cantoria, temos cerca de 72 modalidades poéticas, o que demonstra o vigor da poesia popular nordestina.
ResponderExcluirhum..
ResponderExcluir