PELEJA DE BERNARDO NOGUEIRA
COM PRETO LIMÃO
Quase todas as "PELEJAS" na literatura de cordel são imaginárias, criação individual de determinado poeta que usa o nome de dois cantadores famosos para engendrar a contenda. Algumas são tidas como verdadeiras, caso de INÁCIO DA CAATINGUEIRA E ROMANO DA MÃE D'ÁGUA ou mesma a de CEGO ADERALDO COM ZÉ PRETINHO DO TUCUM. Esta peleja de Bernardo Nogueira com Preto Limão é atribuída a João Martins de Athayde, poeta-editor paraibano que adorava esse gênero:
TRECHOS
PELEJA DE BERNARDO NOGUEIRA COM PRETO LIMÃO
Autor: João Martins de
Athayde
Em Natal já teve um
negro
Chamado Preto Limão
Representador de
talento
Poeta de profissão
Em toda parte cantava
Chamando o povo
atenção
Esse tal Preto Limão
Era um negro inteligente
Em toda parte que
chega
Já dizia abertamente
Que nunca achou
cantador
Que lhe desse no
repente
Nogueira sabendo disto
Prestava pouca atenção
Dizendo: – eu nunca
pensei
Brigar com Preto Limão
Sendo assim da raça
dele
Eu não deixo nem pagão
O encontro destes
homens
Causou admiração
Que abalou o povo em
roda
Daquela povoação
Pra ver Bernardo
Nogueira
Brigar com Preto Limão
Eu sou Bernardo
Nogueira
Santificado batismo
Força de água corrente
Do tempo do
Sacratíssimo
Quando eu queimo as
alpercatas
Pareço um magnetismo
Me chamam Preto Limão
Sou turuna no reconco
Quebro jucá pelo meio
Baraúna pelo tronco
Cantador como Nogueira
Tudo obedece meu ronco
(...)
BN - Cantador com
Nogueira não peleja
Sendo assim como o tal
Preto Limão
Só se for pra tomar
minha lição
Ele engole calado e
não bodeja
Vai comendo da mesa o
que sobeja
Precisa me tratar com
muito agrado
No instante fazer o
meu mandado
É de pressa, é
ligeiro, é sem demora
Qu’eu não gosto de
moleque que se escora
Pois assim é qu’eu o
quero por criado.
PL - Vale a pena não
seres cantador
É melhor trabalhares
alugado
Vai cumprir por aí teu
negro fado
Vai viver sob o ferro
dum feitor
Da senzala já és um
morador
Teu trabalho é lá na
bagaceira
O que ganhas não dá
pra tua feira
Renego tua sorte tão
mesquinha
Que te sujeitas às
amas da cozinha
E te ofereces pra
delas ser chaleira.
BN - Este homem já
vive desvalido
É descrente de Deus e
da Igreja
Lúcifer o teu nome já
festeja
Tu só podes viver é sucumbido
Sois tão ruim que só
andas escondido
Para Deus nunca mais
serás fiel
Tua raça é descendente
de Lusbel
Que do Céu já perdeste
a preferência
Farás tua eterna
convivência
Lá embaixo dos pés de
São Miguel
PL - Tu pareces que
vinhas na carreira
Sempre olhando pra
frente e para trás
Como quem chega assim
veloz de mais
Eu vi bem quatro paus
de macaxeira
Uma jaca partida e
outra inteira
Também vi dois balaios
de algodão
Creio que tu já foste
um ladrão
Com o peso fazia andar
sereno
Às dez horas da noite,
mais ou menos
Encontrei-te com esta
arrumação.
O POETA-EDITOR JOÃO MARTINS DE
ATHAYDE
Naturalidade: Ingá do Bacamarte – PB
Nascimento: 23 de junho de 1880 / Falecimento: 7 de agosto de
1959
Atividades artístico-culturais: Poeta popular, escritor e
editor
João Martins de Athayde nasceu em Cachoeira de Cebolas,
povoado de Ingá do Bacamarte – PB. Não frequentou a escola, aprendeu a ler e
escrever sozinho. Segundo seu próprio depoimento, aos oito anos, assistindo
pela primeira vez a um desafio de Pedra Azul, um famoso cantador da região,
começou a se interessar e fazer poesia popular.
Migrou para Recife, vizinho Estado de Pernambuco. Publicou o
seu primeiro folheto em 1908, impresso na Tipografia Moderna. Um preto e um
branco apurando qualidades. Embora seja da primeira geração dos poetas de
cordel, não pertenceu ao grupo que frequentava a Popular Editora, de Francisco
das Chagas Batista.
Em 1909, conseguiu montar uma pequena tipografia na Rua do
Rangel, no bairro de São José,
tornando-se um dos maiores editores de folhetos de cordel do País. Da sua
oficina saíram, durante mais de quarenta anos, estórias fantásticas, recriações
de estórias famosas, crítica de costumes, notícias de acontecimentos da época
que divertiam, informavam e educavam o homem da cidade grande e das localidades
mais distantes do Nordeste brasileiro.
João Martins de Athayde contribuiu grandemente para o
desenvolvimento da arte e da comercialização do folheto popular no Recife. Foi
o desbravador da indústria do folheto de cordel no País. Industrializando e
comercializando sua produção e a de outros artistas, criou uma grande rede de
atividades lucrativas no Nordeste, que se espalhou para outras regiões
brasileiras, possibilitando a diversos poetas populares se dedicarem exclusivamente
à poesia como atividade profissional.
Foi o responsável por profundas mudanças na edição de
folhetos de cordel, no que se refere à relação entre os artistas e a
tipografia, criando, inclusive, contratos de edição com o pagamento de direitos
de propriedade intelectual, o uso de subtítulos e preâmbulos em prosa e a
sujeição da criação poética ao espaço disponível, fixando-se o padrão dos
folhetos pelo número de páginas em múltiplos de quatro. A apresentação gráfica dos folhetos deu-se
devido às ideias de João Martins de Atayde.
Sua admiração por Leandro Gomes de Barros não era
correspondida. Ao contrário: por duas vezes foi destratado (na resposta ao
folheto Discussão de Leandro Gomes de Barros com João Athayde e na contestação
que recebeu o seu poema O marco do meio mundo). Para Ruth Terra, as respostas
de Leandro, apesar de serem contraditas, revelam o seu reconhecimento da
importância de Athayde. Em 1918, Athayde escreveu A pranteada morte do grande
poeta Leandro Gomes de Barros.
Em 1921, adquiriu os direitos de publicação de toda a obra de
Leandro e iniciou a republicação, inicialmente, se indicando como editor e,
posteriormente, retirando a informação da autoria de Leandro.
Foi aclamado na década de 1940 como o maior poeta popular do
Nordeste.
João Martins de Athayde, no ano de 1949, após haver passado
por um acidente vascular cerebral, se afastou da atividade de editor, vendeu a
sua tipografia para José Bernardo da Silva, repassando-lhe os estoques e os
direitos de edição sobre tudo o que publicou. O cordelista faleceu 10 anos
depois em Limoeiro – PE, no ano de 1959.
Folhetos atribuídos a João Martins de Athayde: A Bela Adormecida no Bosque; A Garça
Encantada; A Menina Perdida; A Moça Que Foi Enterrada Viva; A Paixão de
Madalena; A Pérola Sagrada; A Sorte de uma Meretriz; História Da Moça Que Foi
Enterrada Viva; História Da Princesa Eliza História de Joãozinho E Mariquinha;
História de José do Egito; História de Natanael e Cecília; História de Roberto
do Diabo; História do Valente Vilela; Mabel Ou Lágrimas De Mãe – Dois Volumes;
O Balão do Destino e a Menina da Ilha (2 Volumes); O Estudante que se Vendeu ao
Diabo; O Marco do Meio Mundo; O Namoro de um cego com uma Melindrosa da
Atualidade; O Prisioneiro do Castelo da Rocha Negra; O Retirante; O Segredo da
Princesa; Peleja de Antônio Machado com Manoel Gavião; Peleja de Bernardo
Nogueira Com Preto Limão; Peleja de Laurindo Gato com Marcolino Cobra Verde;
Peleja De Ventania Com Pedra Azul; Raquel e a Fera Encantada; Romance de José
de Sousa Leão do Amazonas, Romeu e Julieta e Um Passeio no Escuro.
Pesquisa de José Paulo Ribeiro (Guarabira-PB)
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