terça-feira, 5 de julho de 2011

CORDEL E SÁTIRA POLÍTICA


O IMPOSTO NA VISÃO DOS CORDELISTAS
(PARTE II)

Conforme já dissemos em postagens anteriores, o poeta popular paraibano Leandro Gomes de Barros foi o pioneiro na publicação de versos rimados no final do século XIX, sendo considerado o “pai” da Literatura de Cordel. Leandro escreveu longas histórias que ainda hoje são reimpressas e procuradas como “Juvenal e o Dragão”, “História da Donzela Teodora”, “O Boi Misterioso”, “O Cachorro dos Mortos” e muitas outras. Mas o velho poeta também valeu-se da crítica e da sátira em diversos folhetos. O descaso dos governantes com as populações pobres e sofridas do Nordeste, a guerra, a seca e o aumento dos impostos foram duramente criticados pelo grande trovador.
Folhetos como “Padre-Nosso do Imposto”, “O aumento do selo e a crise atual” e “Panelas que muitos mexem” dão a exata dimensão da verve criativa de Leandro. Na verdade, o poeta queixava-se da cobrança de impostos porque os governantes não os transformavam em benefícios para os mais carentes. Vejamos alguns trechos de “O imposto de honra”, escrito no início do século passado:
O velho mundo vai mal.
E o governo danado
Cobrando imposto de honra
Sem haver ninguém honrado.
E como se paga imposto
Do que não tem no mercado?

Procurar honra hoje em dia
É escolher sal na areia
Granito de pólvora em brasa
Inocência na cadeia
Agua doce na maré
Escuro na lua cheia.

Agora se querem ver
O cofre público estufado
E ver no Rio de Janeiro
O dinheiro armazenado?
Mande que o governo cobre
Imposto de desonrado.

Porém imposto de honra?
É falar sem ver alguém
Dar remédio a quem morreu
Tirar de onde não tem
Eu sou capaz de jurar
Que esse não rende um vintém.

Com os incêndios da alfândega
Como sempre tem se dado
Dinheiro que sai do cofre
Sem alguém ter o tirado
Mas o empregado é rico
Faz isso e diz: — Sou honrado.

Dizia Venceslau Brás
Com cara bastante feia
Diabo leve a pessoa
Que compra na venda alheia
O resultado daí
É o freguês na cadeia.

Ora o Brasil deve à França
Mas a dívida não foi minha
Agora chega Paris
Tira o facão da bainha
E diz: — Quero meu dinheiro
Inda que seja em galinha.

Seu fulano dos anzóis
Entrou e meteu o pau
Pensou que tripa era carne
E gaita era berimbau
Vão cobrar desse, ele diz,
Quem paga é seu Venceslau.

Disse Hermes da Fonseca
Eu não tinha nem um x.
Mas achei quem emprestasse
Tomei tudo quanto quis
Embora tivesse feito
A derrota do país.

(...)


(Em O cordel; testemunha da história do Brasil. Rio de Janeiro, Fundação Casa de Rui Barbosa, 1987. Literatura popular em verso, antologia nova série, 2)




Outro folheto interessante, satirizando a cobrança de impostos é “Discussão de um Fiscal com uma Fateira*”, do pernambucano Manoel de Assis Campina, do qual apresentamos alguns trechos:




Certo dia eu viajei
Da cidade de Palmeira
Com destino ao sertão
Em Serra da Cachoeira
Vi uma grande questão
Dum fiscal com uma fateira.


Começou a discussão
Por causa de uma coleta
A fateira se zangou
Disse ao fiscal: - Pegue a reta,
Queime o chão e vá embora,
Não quero ouvir indireta!


(...)


Disse o fiscal: - Minha dona
Não interessa a questão
Me pague 15 cruzeiros
Que eu passo o seu talão
Disse a velha: - Dê o fora,
Pega a reta, queime o chão!


Onde foi que já se viu
Pagar imposto de tripa?
Hoje aqui eu brigo muito
E não pago essa “sulipa”
Posso pagar na cadeia
Depois que meter-lhe a ripa!



(...)



Disse o fiscal: - Está presa
A sua mercadoria,
Vá falar com seu Argeu
Chefe da coletoria
Não posso está empalhado
Aqui nessa porcaria!


Quando ele disse assim,
A velha se
engreguenou

Saltou de um lado da banca
Um mocotó agarrou
Passou-lhe no pé do ouvido
Que o fiscal inda tombou.


Aí o povo invadiu
Naquela ocasião
A fateira como doida
Com o mocotó na mão
Quando raspava de lado
Dois e três iam no chão.


* Vendedora de vísceras
Texto publicado no jornal “FALA FISCO”, informativo do SINTAF-CE, 2006


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2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Cultura do meu sertão
    Quem é do Nordeste conhece
    Quem não é, não tem no sangue
    Essa paixão!

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