NA PREFEITURA TEM
UM PAR DE ARMADORES
Reza o velho adágio popular que “uma andorinha só
não faz verão”. Talvez tenha sido com esse intento que o cantador Manoel
Andorinha, natural de Itatira, resolveu casar-se com dona Júlia e, dessa união,
nasceram alguns rebentos, dentre os quais o poeta, compositor e humorista João
Batista Azevedo dos Santos, o popular Jota Batista, figura conhecidíssima em
Canindé e municípios vizinhos.
Jota Batista despontou em meados da década de
1980 como um inspirado compositor, vencendo diversos festivais de música
promovidos em Canindé e outras cidades do interior cearense. Dessa primeira
leva de canções, constam “Plangente cantador” e “Nordeste velho pra ter água”,
ambas registradas no LP “Rabiscos”, trabalho coletivo, em parceria com Myrza e Di Assis, cuja capa e encarte foram produzidos por
mim, ainda nos velhos tempos da prancheta, do nanquim e da “letraset”. Com a
renovação da tecnologia e a substituição do disco de vinil pelo CD, Jota
Batista gravou o seu segundo trabalho, desta feita sozinho, passeando por vários
ritmos musicais, inclusive o brega rasgado de “Pãozinho de amor” e o pegajoso
bolero “Dama leviana”, feito em parceria com o poeta Pedro Paulo Paulino. Antes
disso, teve a sua composição “Miscigenação”, feita em louvor à romaria de
Canindé, gravada em disco por Walter Guimarães, no LP “Praça do Romeiro”,
produzido por José Anastácio Pereira, o Zequinha.
Jota Batista tem uma verve aguçada. É um
humorista nato, daqueles que perdem um amigo, mas não perdem a piada. Seus
trabalhos mais pitorescos estão justamente na forma de cordéis ou paródias,
algumas feitas sob encomenda durante as campanhas eleitorais. Duas delas
merecem registro. A primeira foi feita para o Chico Mendonça, candidato a
vereador por Canindé e a outra para o saudoso Magalhães Neto, candidato a
prefeito na mesma cidade. A de Chico Mendonça é uma paródia do samba “Chico
Dum-Dum”, de Herivelto Martins e Marino Pinto, magistralmente gravada no
acetato pelo eterno boêmio Nélson Gonçalves. Vejamos a versão do Jota Batista:
Chico Mendonça,
Um candidato sem dinheiro
Se aliou com o ‘Doutor’
Um amigo verdadeiro...
E no bairro do Mateus
Trabalhou com afinco
Esperou muitos votos...
No final só tinha CINCO.
Um candidato sem dinheiro
Se aliou com o ‘Doutor’
Um amigo verdadeiro...
E no bairro do Mateus
Trabalhou com afinco
Esperou muitos votos...
No final só tinha CINCO.
No outro dia,
O Chico Mendonça
Arengou com o ‘Doutor’
E de madrugada, depois de apuradas
As urnas do Mateus... Os votos seus,
Nos “bê-us” não estavam*
Nas urnas não constavam
E o Chico, adeus!
(* B.U. Boletim de Urna)
Já o Magalhães Neto, de saudosa memória, foi candidato a prefeito em
Canindé em três ou quatro ocasiões, depois de ter sido nomeado interventor no
vizinho município de Aratuba. Há quem diga que ele só perdeu uma eleição porque houve fraude, tamanha era a sua popularidade frente aos opositores. Quando foi Secretário de Educação em Canindé, eu estava justamente na pasta da Cultura e fizemos, além de uma boa parceria, uma sólida amizade. Magalhães Neto era muito sensível à causa da cultura e até já trabalhara na TV Ceará, em programas musicais.
O Magá, como era conhecido pelos conterrâneos, era um cara alegre, bonachão e requisitava sempre a colaboração do Jota para fazer os seus jingles de campanha. O problema é que, às vezes, esquecia de acertar os valores previamente combinados, mas no pleito seguinte fazia-se de esquecido e procurava o Jota novamente. Certa feita, alta madrugada, parou o seu ‘bugre’ em frente à casa do autor de “Pãozinho de amor” e deu umas quatro ou cinco buzinadas. Quando o Batista saiu, com aquela cara de sono interrompido, o Magá abriu os braços, deu-lhe um amplexo efusivo e foi logo dizendo:
O Magá, como era conhecido pelos conterrâneos, era um cara alegre, bonachão e requisitava sempre a colaboração do Jota para fazer os seus jingles de campanha. O problema é que, às vezes, esquecia de acertar os valores previamente combinados, mas no pleito seguinte fazia-se de esquecido e procurava o Jota novamente. Certa feita, alta madrugada, parou o seu ‘bugre’ em frente à casa do autor de “Pãozinho de amor” e deu umas quatro ou cinco buzinadas. Quando o Batista saiu, com aquela cara de sono interrompido, o Magá abriu os braços, deu-lhe um amplexo efusivo e foi logo dizendo:
— Sou candidato novamente! E dessa vez é para
ganhar! Vim encomendar minhas músicas.
Ressabiado e ressacado, o Jota balançou a cabeça
a moda lagartixa e assentiu, dizendo-lhe que passasse novamente dois ou três dias
depois, para apanhar a encomenda. Por essa época, Elba Ramalho havia estourado
um xote intitulado “Pra ninar meu coração”, da autoria de Maciel Melo. Jota
Batista aproveitou o ritmo contagiante da canção e encaixou esses versos na
pegajosa melodia:
PRA
NINAR O ELEITOR
Magalhães Neto a tua vez chegou agora
Tu podes crer que vais ganhar esta eleição
Tem muito nêgo só de ôi na Prefeitura
E se esquecendo dos anseios do povão.
Vem depressa vem matar a tua sede
Vem ligeiro, vem cuidar do eleitor...
Vem, vem, VEM ARMAR A TUA REDE
NA PREFEITURA TEM UM PAR DE ARMADOR.
Ora, alguns adversários do Magá, maledicentes como a maioria dos políticos, o tinham na conta de
preguiçoso, ou pelo menos de acomodado e apregoavam que a letra do Jota
era uma vingança velada pelos “chêchos” recebidos nas campanhas
anteriores. Política é assim mesmo. Quem entra na chuva é para se queimar, já dizia o saudoso Salomão de Paula Uchoa.
(...)
Essa crônica será publicada integralmente no livro NO TEMPO DA LAMPARINA, Volume II de Memórias, de Arievaldo Viana, que será lançando em 2018. AGUARDEM!
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