LUIZ CAMPOS - Fonte: Jornal O MOSSOROENSE
Luiz de Oliveira Campos nasceu em Mossoró aos 11 de outubro de 1939, Luís é considerado como um dos maiores poetas da região. Hoje, apesar dos sérios problemas de visão ele não perde o bom-humor nem a verve poética.
Por Caio César Muniz
O Mossoroense - Você começou o seu trabalho como cantador ou como cordelista?
Luís Campos - Comecei como cantador. A primeira cantoria minha foi em Pedreiras, no Maranhão, no dia 7 de setembro de 1963. Eu saí daqui como rico, eu tinha um comércio, mas quando eu cheguei em Pedreiras eu alisei. Então eu disse: "eu vou me recorrer ao que eu sei". Naquele tempo eu já tocava umas moda de viola, então eu pedi um violão emprestado a um xará meu, mas ele disse que não podia emprestar, mas se eu quisesse ele alugaria, então eu aluguei por cinco cruzeiros. Adaptei as cordas e fiz a minha primeira cantoria com Campo Verde, eu tenho muito orgulho em falar neste nome, porque foi com quem eu estreei como profissional. Desse dinheiro que eu ganhei nesta cantoria em comprei a minha primeira viola.
OM - Na sua época, Luís, com quem você cantava?
LC - Eu viajei por dezessete estados. Eu comecei a cantar em Pedreiras e quando eu cheguei aqui, eu recebi como estreante Ivanildo Vilanova, eu viajei muito com o pai de Ivanildo, depois com Otacílio Batista, Lourival Batista, Chico Pedra, Elizeu Ventania, Nestor Bandeira, Justo Amorim, todos estes do Nordeste, mas peguei muita fera por aí.
OM - Quais os destaques da viola naquela época?
LC - Na época em que eu comecei eram os irmãos Batista - Dimas, Otacílio e Lourival - estes três eram nomes nacionais. Depois veio Ivanildo e tomou a liderança, liderou por muito tempo este movimento. Teve também o saudoso Severino Ferreira, que Deus o tenha, estes eram os nomes mais fortes.
OM - Existe alguma diferença entre os cantadores de antigamente e os atuais?
LC - Existe. Para começar antigamente os cantadores andavam a pé. Isso criava uma amizade mais forte. Existia uma fidelidade um para com o outro. Eu por exemplo, tirava uma temporada de quinze dias com Zé Pereira, se alguém me procurava naquele período para eu ir fazer qualquer outra cantoria eu dizia: "não, rapaz, eu estou numa temporada com Zé Pereira" e era assim. Cansei de ir de Aracati para Fortaleza a pé, cantando de praia em praia. Hoje não tem mais isso, a cantoria de antigamente o motivo era o que acontecia na hora, ali. Hoje não, o cantador pega um assunto e eu digo que ele "mecaniza" aquele assunto. Eu fui da época em que os cantadores botavam nos livros, hoje eles estão tirando dos livros.
OM - Era melhor naquela época ou agora?
LC - Era melhor naquela época. Teve uma ocasião em que eu comprei uma geladeira à vista com o dinheiro de uma só cantoria, hoje não tem mais isso. Vamos ser claros, me perdoem, mas hoje em dia não existe cantoria, existe show. Têm estes festivais, as pessoas vêm de fora e fazem aquela apresentação, aquilo não é cantoria, é show. Eu cheguei a cantar de sete horas da noite às seis da manhã. Eu peguei mais pesado.
OM - E o cordel, quando você se deparou com o cordel?
LC - Eu escrevi o meu primeiro cordel com oito anos, chamava-se "Zezinho e Aldenora". Na época eu adoeci, tive uma febre, e nunca fui de ficar parado. Então eu fiquei fazendo aquilo e eu tinha um tio que era cantador, quando ele chegou que eu mostrei ele disse: "é melhor do que eu só não sabe cantar". Era um cordelzinho até bonito para idade, mas se perdeu na memória.
OM - Dá para viver de poesia?
LC - Dá. Antônio Francisco está vivendo de poesia. E a gente vende aqui acolá uns cordeizinhos.
OM - Os nossos poetas são reconhecidos?
LC - Alguns. Mas nós temos muita gente no anonimato. Muita gente boa mesmo. O poder público poderia fazer um trabalho de amparo a esse povo. Eu tenho uns vinte a trinta cordéis publicados por aí mas acho que nenhum político, que é quem deve apoiar a gente, tomou conhecimento disso, nunca leu.
OM - "Me Enganei Com Minha Noiva" é um dos seus trabalhos mais conhecidos, foi gravado por Genildo Costa e Amazan. Como você vê a repercussão deste seu trabalho?
LC - Eu fico muito feliz. Certa vez eu liguei a televisão, coisa de meia-noite e tava lá um camarada recitando este poema... longe. Mas eu nunca fui beneficiado com este trabalho, a não ser a Somzoom Sat que me pagou duas vezes uma ninharia lá, depois parou. E ganho quando eu saio por aí vendendo o cordel.
OM - E o que houve que você não recebeu mais os direitos autorais?
LC - Não sei. Dizem lá que a gravadora fechou, faliu, quebrou, sei lá. Amazan não tem nada com isso, a gravadora é que parou de me pagar.
OM - Você escreveu um cordel chamado "O Meu Caso é um Descaso" onde você fala com um certo rancor de Mossoró, o que houve?
LC - Olhe, tudo que está escrito ali é verdade. Eu trabalhei muito em Mossoró, fiz muita coisa e Mossoró não me conhece. Aquela casa que era de Rosalba, quem emadeirou fui eu. Não sei se está do mesmo jeito. Era uma casa de primeiro andar. Ali eu sofri uma queda que passei dois meses doente. Meu pai tem muitos serviços prestados a Mossoró, foi quem botou aquela cruz da igreja São Vicente, sou combatente contra o bando de Lampião, mas ninguém sabe disso.
OM - Você atribui isso a quê, falta de memória do povo?
LC - Eu acho que a minha falta de sorte (risos).
OM - Você continua escrevendo?
LC - Escrevendo, não. Eu estou só com três por cento da minha visão. Mas eu guardo muita coisa na memória. Um dia desses eu estava por aqui, fazendo uma brincadeira para uns amigos com a viola, eu e Severino Inácio, era época de campanha eleitoral e parou um desses carros de som no maior volume. Então eu fiz um poema, onde eu peço a Tica, que é a dona do bar, para continuar a cantoria. Diz assim:
Tica me faça um favor
Se acaso tiver me ouvindo
E diga àqueles cachorros
Que, por favor, tô pedindo
Que vão latir noutro canto
Que aqui já tem dois latindo.
E sexta-feira eu tava cantando lá no Redenção e Severino Inácio me deu um mote dizendo que lá tinha mulher de ruma, então eu fiz este:
Eu também possui uma
Que hoje mora bem ali
Tirei ela de um convento
De freiras do Aracati
Deixou de ser freira lá
Pra ser rapariga aqui.
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Luiz de Oliveira Campos nasceu em Mossoró aos 11 de outubro de 1939, Luís é considerado como um dos maiores poetas da região. Hoje, apesar dos sérios problemas de visão ele não perde o bom-humor nem a verve poética.
Por Caio César Muniz
O Mossoroense - Você começou o seu trabalho como cantador ou como cordelista?
Luís Campos - Comecei como cantador. A primeira cantoria minha foi em Pedreiras, no Maranhão, no dia 7 de setembro de 1963. Eu saí daqui como rico, eu tinha um comércio, mas quando eu cheguei em Pedreiras eu alisei. Então eu disse: "eu vou me recorrer ao que eu sei". Naquele tempo eu já tocava umas moda de viola, então eu pedi um violão emprestado a um xará meu, mas ele disse que não podia emprestar, mas se eu quisesse ele alugaria, então eu aluguei por cinco cruzeiros. Adaptei as cordas e fiz a minha primeira cantoria com Campo Verde, eu tenho muito orgulho em falar neste nome, porque foi com quem eu estreei como profissional. Desse dinheiro que eu ganhei nesta cantoria em comprei a minha primeira viola.
OM - Na sua época, Luís, com quem você cantava?
LC - Eu viajei por dezessete estados. Eu comecei a cantar em Pedreiras e quando eu cheguei aqui, eu recebi como estreante Ivanildo Vilanova, eu viajei muito com o pai de Ivanildo, depois com Otacílio Batista, Lourival Batista, Chico Pedra, Elizeu Ventania, Nestor Bandeira, Justo Amorim, todos estes do Nordeste, mas peguei muita fera por aí.
OM - Quais os destaques da viola naquela época?
LC - Na época em que eu comecei eram os irmãos Batista - Dimas, Otacílio e Lourival - estes três eram nomes nacionais. Depois veio Ivanildo e tomou a liderança, liderou por muito tempo este movimento. Teve também o saudoso Severino Ferreira, que Deus o tenha, estes eram os nomes mais fortes.
OM - Existe alguma diferença entre os cantadores de antigamente e os atuais?
LC - Existe. Para começar antigamente os cantadores andavam a pé. Isso criava uma amizade mais forte. Existia uma fidelidade um para com o outro. Eu por exemplo, tirava uma temporada de quinze dias com Zé Pereira, se alguém me procurava naquele período para eu ir fazer qualquer outra cantoria eu dizia: "não, rapaz, eu estou numa temporada com Zé Pereira" e era assim. Cansei de ir de Aracati para Fortaleza a pé, cantando de praia em praia. Hoje não tem mais isso, a cantoria de antigamente o motivo era o que acontecia na hora, ali. Hoje não, o cantador pega um assunto e eu digo que ele "mecaniza" aquele assunto. Eu fui da época em que os cantadores botavam nos livros, hoje eles estão tirando dos livros.
OM - Era melhor naquela época ou agora?
LC - Era melhor naquela época. Teve uma ocasião em que eu comprei uma geladeira à vista com o dinheiro de uma só cantoria, hoje não tem mais isso. Vamos ser claros, me perdoem, mas hoje em dia não existe cantoria, existe show. Têm estes festivais, as pessoas vêm de fora e fazem aquela apresentação, aquilo não é cantoria, é show. Eu cheguei a cantar de sete horas da noite às seis da manhã. Eu peguei mais pesado.
OM - E o cordel, quando você se deparou com o cordel?
LC - Eu escrevi o meu primeiro cordel com oito anos, chamava-se "Zezinho e Aldenora". Na época eu adoeci, tive uma febre, e nunca fui de ficar parado. Então eu fiquei fazendo aquilo e eu tinha um tio que era cantador, quando ele chegou que eu mostrei ele disse: "é melhor do que eu só não sabe cantar". Era um cordelzinho até bonito para idade, mas se perdeu na memória.
OM - Dá para viver de poesia?
LC - Dá. Antônio Francisco está vivendo de poesia. E a gente vende aqui acolá uns cordeizinhos.
OM - Os nossos poetas são reconhecidos?
LC - Alguns. Mas nós temos muita gente no anonimato. Muita gente boa mesmo. O poder público poderia fazer um trabalho de amparo a esse povo. Eu tenho uns vinte a trinta cordéis publicados por aí mas acho que nenhum político, que é quem deve apoiar a gente, tomou conhecimento disso, nunca leu.
OM - "Me Enganei Com Minha Noiva" é um dos seus trabalhos mais conhecidos, foi gravado por Genildo Costa e Amazan. Como você vê a repercussão deste seu trabalho?
LC - Eu fico muito feliz. Certa vez eu liguei a televisão, coisa de meia-noite e tava lá um camarada recitando este poema... longe. Mas eu nunca fui beneficiado com este trabalho, a não ser a Somzoom Sat que me pagou duas vezes uma ninharia lá, depois parou. E ganho quando eu saio por aí vendendo o cordel.
OM - E o que houve que você não recebeu mais os direitos autorais?
LC - Não sei. Dizem lá que a gravadora fechou, faliu, quebrou, sei lá. Amazan não tem nada com isso, a gravadora é que parou de me pagar.
OM - Você escreveu um cordel chamado "O Meu Caso é um Descaso" onde você fala com um certo rancor de Mossoró, o que houve?
LC - Olhe, tudo que está escrito ali é verdade. Eu trabalhei muito em Mossoró, fiz muita coisa e Mossoró não me conhece. Aquela casa que era de Rosalba, quem emadeirou fui eu. Não sei se está do mesmo jeito. Era uma casa de primeiro andar. Ali eu sofri uma queda que passei dois meses doente. Meu pai tem muitos serviços prestados a Mossoró, foi quem botou aquela cruz da igreja São Vicente, sou combatente contra o bando de Lampião, mas ninguém sabe disso.
OM - Você atribui isso a quê, falta de memória do povo?
LC - Eu acho que a minha falta de sorte (risos).
OM - Você continua escrevendo?
LC - Escrevendo, não. Eu estou só com três por cento da minha visão. Mas eu guardo muita coisa na memória. Um dia desses eu estava por aqui, fazendo uma brincadeira para uns amigos com a viola, eu e Severino Inácio, era época de campanha eleitoral e parou um desses carros de som no maior volume. Então eu fiz um poema, onde eu peço a Tica, que é a dona do bar, para continuar a cantoria. Diz assim:
Tica me faça um favor
Se acaso tiver me ouvindo
E diga àqueles cachorros
Que, por favor, tô pedindo
Que vão latir noutro canto
Que aqui já tem dois latindo.
E sexta-feira eu tava cantando lá no Redenção e Severino Inácio me deu um mote dizendo que lá tinha mulher de ruma, então eu fiz este:
Eu também possui uma
Que hoje mora bem ali
Tirei ela de um convento
De freiras do Aracati
Deixou de ser freira lá
Pra ser rapariga aqui.
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