Cordelista e folheteiro Jesus Sindeaux
Literatura de
Cordel pode se tornar Patrimônio Cultural do Brasil
Entre
versos, rimas e cantoria, a Literatura de Cordel é uma expressão cultural
popular que abrange não apenas as letras, mas também a música e a ilustração. É
um gênero literário, veículo de comunicação, ofício e meio de sobrevivência
para inúmeros cidadãos brasileiros. Poetas, declamadores, editores,
ilustradores (desenhistas, artistas plásticos, xilogravadores) e folheteiros
(como são conhecidos os vendedores de livros) podem entrar na torcida, pois
agora a Literatura de Cordel pode ser reconhecida como Patrimônio Cultural
Imaterial Brasileiro. Apesar de ter começado no Norte e no Nordeste do país, o
cordel hoje é disseminado por todo o Brasil, principalmente por causa do
processo de migração de populações. Hoje, circula com maior intensidade na
Paraíba, Pernambuco, Ceará, Maranhão, Pará, Rio Grande do Norte, Alagoas,
Sergipe, Bahia, Minas Gerais, Distrito Federal, Rio de Janeiro e São Paulo. Em
todos estes estados é possível encontrar esta expressão cultural, que revela o
imaginário coletivo, a memória social e o ponto de vista dos poetas acerca dos
acontecimentos vividos ou imaginados.
Poeta Lucas Evangelista, um dos mais antigos no ramo
A
Literatura de Cordel no Brasil é o resultado de uma série de práticas culturais
em que os cantos e os contos – e suas variantes – constituem as matrizes a
partir das quais uma série de formas de expressão se forjou. Na formação da
cultura brasileira, da qual a literatura de cordel faz parte, tanto indígenas
quanto africanos e portugueses adicionaram práticas de transmissão oral de suas
cosmologias, de seus contos, de suas canções. A questão da harmonia sonora é
muito ressaltada pelos poetas. Além das razões estéticas, há uma explicação
histórica para isso. No início do século XX, quando a literatura de cordel se
consolidou como um sistema editorial próprio, os poetas desenvolveram um modo
particular de comercializar seus livros nos mercados e feiras livres.
Carregavam consigo os exemplares e montavam uma banca em que os folhetos eram
exibidos (por esse motivo os poetas da literatura de cordel também são chamados
de poetas de bancada). Para atrair curiosos e compradores, os poetas costumavam
cantar em voz alta trechos dos poemas, contando dramas, tragédias, romances e
sátiras. No momento mais importante da narrativa – quando o desfecho da
história de aproximava – o canto era interrompido e o final da história só
poderia ser conhecido por aqueles que comprassem o folheto. Assim, a métrica
perfeita era a condição para que o poeta pudesse exercer sua performance com
maestria diante do público.
Literatura
de Cordel
Na região do Pajeú (sertão de Pernambuco), a declamação ainda hoje é
praticada cotidianamente pela população. Atualmente, os declamadores gravam
suas performances em discos e vídeos que são comercializados em festivais e
feiras de literatura de cordel. Além da declamação, outro modo particular de
jogo verbal se difundiu e se popularizou no Brasil: o desafio – ou peleja – se
define como uma disputa oral, em geral entre duas pessoas, cujo objetivo é
vencer o adversário por meio do virtuosismo poético diante do público. Além da
viola – instrumento mais comum na cantoria –, a rabeca também era utilizada por
alguns cantadores.
A
literatura de cordel faz parte da vida social dos brasileiros. Ao longo do
tempo, por meio das trocas e empréstimos culturais com a música, o cinema, o
teatro, as novelas e as redes sociais, se atualizou e se transformou, sem
perder a identidade, a originalidade e sua estética própria, particular.
Entrevista com o poeta Natan Marreiro, Canindé-CE
Origens
A
literatura de cordel é um gênero poético que resultou da conexão entre as
tradições orais e escritas presentes na formação social brasileira e carrega
vínculos com as culturas africana, indígena e europeia e árabe. Trata-se de um
fenômeno cultural vinculado às narrativas orais (contos e histórias de origem
africana, indígena e europeia), à poesia (cantada e declamada) e à adaptação
para a poesia dos romances em prosa trazidos pelos colonizadores portugueses.
Os poetas brasileiros no século XIX conectaram todas essas influências e
difundiram um modo particular de fazer poesia que se transformou numa das
formas de expressão mais importantes do Brasil.
O
cordel se inseriu na cultura brasileira em fins do século XIX, forjado como a
variação escrita da poesia musicada por duplas de cantadores de viola, de
improviso, conhecida como repente. A expressão literatura de cordel não se
refere num sentido estrito a um gênero literário específico, mas ao modo como
os livros eram expostos ao público. No entanto, cada vez mais essa expressão
foi sendo associada a um conjunto de edições de baixo custo, adaptações de
textos provenientes das mais diversas fontes (obras até então manuscritas,
narrativas orais, peças de teatro cômico) destinadas a um número cada vez maior
de leitores pouco familiarizados com a escrita e, por esse motivo, diversos
procedimentos editoriais foram introduzidos a fim de tornar a leitura mais
fácil: diminuição do tamanho da obra ao enxugar o livro por meio do emprego de
textos curtos, uso de papel de baixa qualidade e redução dos preços.
Os
poetas costumam definir a literatura de cordel como um gênero literário que
obrigatoriamente possui três elementos: métrica, rima e oração. Esses três
elementos da poética do cordel constituem os fundamentos que precisam ser
apropriados por quem deseja produzir um cordel. Ao compor um cordel com
métrica, rima e oração, o poeta aciona os resultados de um longo aprendizado,
de uma formação que não se obtém na escola, mas a partir do convívio com outros
poetas, ou seja, a partir uma tradição coletiva que se transmitiu ao longo de
gerações.
FONTE:
http://portal.iphan.gov.br/noticias/detalhes/4819