QUASE TRÊS DÉCADAS PASSADAS
SEM LUIZ E ALGODÃO
“Bate
a enxada no chão
Limpa
o pé de algodão
Pois
pra vencer a batalha
Precisa
ser forte, robusto
E
nascer no sertão...”
(Algodão – Luiz Gonzaga | Zédantas)
Luiz Gonzaga do Nascimento, o Gonzagão,
foi o primeiro compositor nordestino a fazer sucesso no eixo Rio-São Paulo com os
ritmos da nossa Região. O Rei do Baião morreu há 28 anos, no dia 2/8/1989, aos
76 anos. O músico, que se dizia não apenas o inventor do baião, mas também do
forró, das marchinhas juninas e "de tudo que se chama arrasta-pé",
foi descoberto no final dos anos 1930 no programa de Ari Barroso. Ao fazer
parceria com o cearense Humberto Teixeira, a partir de 1946, Luiz Gonzaga
começou a emplacar uma série de sucessos imortais, dentre os quais destacam-se Baião, Asa Branca, Assum Preto, Estrada do
Canindé, Mangaratiba, dentre outros. A “trindade” do baião completou-se com
o médico pernambucano José de Sousa Dantas, o inesquecível Zédantas, criador de
A volta da asa branca, Paulo Afonso,
Sabiá e Algodão, uma das mais
belas canções sobre o sertanejo nordestino.
Hoje vamos relembrar os 28 anos da
partida de Gonzagão com essa crônica que escrevi na noite de ontem, falando
sobre o OURO BRANCO, praticamente extinto em nossa região.
Afetado pela praga do “bicudo”, na
década de 1980, o algodão, que constituía a maior riqueza de nossa agricultura
foi aos poucos desaparecendo. Como sertanejo, nascido e criado nos cafundós do
Ceará, acostumado a ver minha família no cultivo e manejo dessa lavoura, é
impossível não se comover diante de um pé carregado de plumas branquinhas, sob
o azul marinho de um céu de “verão”. Passemos à crônica:
FLOCOS DE ALGODÃO DOCE
João Miguel subiu na cisterna, posou
para foto, estirou o dedinho e perguntou:
- Pai, que planta bonita é aquela?
- É algodão, meu filho. Ouro branco que
fazia o nosso povo feliz...
- Algodão doce?
- Não... Algodão de fibra, para fazer
roupas, meias..
- Ah, sim. É o algodão do Luiz Gonzaga?!
(O menino gosta do Gonzagão, pois estou
sempre escutando suas canções. E Algodão é uma das minhas preferidas).
Durante esse fim de semana, vimos
diversos pés de algodão, mocó e verdão, carregados de plumas branquinhas nas
margens da BR 020 e também da estreita rodovia que liga Macaóca a Itatira.
Por conta disso, eu quis lembrar dos
meus tempos de menino, quando passava férias escolares no Ouro Preto e ganhava
uns trocados apanhando algodão nas capoeiras de meu avô. Às vezes vovô Mané
Lima me dava uma "cata" para apanhar de meia e isso me rendia um bom
numerário.
A falta de um bornal, peguei um balde de
plástico, desses de 20 litros, e resolvi apanhar o algodão. Um formigueiro
assanhado quase me devora os pés, mas eu não esmoreci. Apanhei uns três quilos
ou mais, na intenção de aproveitar os caroços para uma planta futura. A pluma serve
perfeitamente para fazer uns pavios de lamparina. O comentário pode parecer
obsoleto e descabido, mas na minha recente estadia no sertão, tivemos um apagão
de mais de duas horas e foi justamente um velho candeeiro que nos garantiu a
luz até o retorno da energia elétrica.
Estava eu entretido nessa faina, quando
dois "sertanejos" passaram numa moto e eu me fiz de desentendido.
Olhei para os cabras e perguntei:
- Vocês sabem me dizer que planta é
essa?
Um deles, de brinco na orelha, boné
atolado na cabeça e camiseta do Aviões do Forró coçou a cabeça e disse...
- É... Eu acho que isso aí é COTTON.
- Cotton?
- É cotton, que antigamente a galera
chamava de algodão, tá ligado?
- Ah, está bem. E por que vocês não
apanham esse algodão?
Os caras se entreolharam, aceleraram a
moto e saíram sorrindo.
Pensei com meus botões...
- Acho que não apanham o COTTON com medo
que caiam as HANDS.
(De O LIVRO DAS CRÔNICAS - Arievaldo Vianna)