HÁ 126 ANOS NASCIA LEONARDO MOTA
Leonardo
Mota (Leonardo Ferreira da Mota), jornalista e folclorista, nasceu em Pedra
Branca CE, em 10/5/1891, e faleceu em Fortaleza CE, em 2/1/1948. Formou-se pela
Faculdade de Direito do Ceará, em 1916.
Colaborou
na imprensa cearense e do Sul do país. Publicou alguns volumes com farto
documentário sobre o sertão nordestino, principalmente com referência à
literatura oral — poesia, anedotário e adagiário:
Cantadores, Rio de Janeiro, 1921 (2ª. ed., Rio de Janeiro, 1953;
3ª. ed., Fortaleza, 1961); Violeiros do
Norte, São Paulo, 1925 (2ª. ed., Rio de Janeiro, 1955; 3ª. ed., Fortaleza,
1962); Sertão Alegre, Belo Horizonte,
1928 (2ª. ed., Fortaleza, 1965; 3ª. ed., Rio de Janeiro, 1976); No tempo de Lampião, Rio de Janeiro,
1930; Prosa vadia (Palestras
lítero-humorísticas), Fortaleza, 1932; A
padaria espiritual, Fortaleza, 1939.
Leota
na defesa
do folclore nordestino
do folclore nordestino
Nos
cafés existentes na antiga Fortaleza, onde intelectuais e poetas se reuniam
diariamente, uma figura se destacava nas conversas, nas histórias bem humoradas
sobre o homem do sertão: Leonardo Mota. Com o poder incomum de declamação,
atraia sempre a atenção geral, divulgando através de sua memória prodigiosa os
mais belos versos do cancioneiro popular. No Café Riche, Maison Art Noveau e
Bar do Majestic, palcos tradicionais da sociedade cearense da época, ele
brilhava na poesia. Um autêntico boêmio que legou ao Brasil os maiores estudos
sobre o folclore. Um escritor que alcançou, em vida, a fama, o sucesso.
Rachel
de Queiroz, da Academia Brasileira de Letras, lembra que o livro de estréia de
Leonardo Mota, "Cantadores", conseguiu ser naquele tempo um
"best-seller": "Sucesso difícil para um gênero considerado árido
- pois quem, senão eruditos, lê folcloristas? Mas Leonardo Mota - ou antes
Leota, o seu pseudônimo predileto - era lido com avidez e entusiasmo não só
pelos seus colegas especialistas, como também pelo público em geral, dada a
apresentação deliciosa dos temas, a inteligência na escolha do Material posto
nos livros, a par da fidelidade exemplar com que ele reproduzia o falar
sertanejo em toda a sua pura autenticidade e riqueza".
A
autora do romance "O Quinze" observa que tais estudos não calam nos
exageros e ridículos do chamado "falar caipira", que é uma
contrafação posta em voga pelo teatro de revista, com fins de comicidade
fácil". Diz que a seriedade de seus trabalhos era de tal forma
surpreendente que "os cantadores profissionais consideravam a inclusão de
seus versos num dos livros de Leonardo, como a consagração suprema, e a
disputavam com afinco".
- E
olha que não se tratava - complementa Rachel - de "cantadores" dessa
fauna pobre e poluída pelo rádio, que anda hoje por ai, era o tempo dos
gigantes, dos mestres ainda não superados e até agora imitados, que deixaram
marca indelével no cancioneiro nordestino.
Sânzio
de Azevedo, professor de Literatura na Universidade Federal do Ceará, destaca a
importância de Leonardo Mota: "Ele se aprofundou nas pesquisas sobre o
folclore, sendo imenso o número de trovas, desafios e anedotas que colheu
diretamente do povo, em longas viagens ao interior, o que lhe valeria a fama de
um dos maiores folcloristas do Brasil em todos os tempos". Além de
recolher trabalhos que eram dispersos pelo tempo, Leota se dedicava também à
poesia. O soneto "Pedra" um exemplo:
-
Pedra que eu amo, pedra confidente/
De todo o mal que o coração tortura,/
Tu, que tens a serena compostura/
De quem da vida a inquietação não sente,
Tu, que vives de todo indiferente/
Ao lodaçal desta charneca impura/
Que nós chamamos mundo, pedra escura/
Que eu te cobice a placidez consente!
Pudesse eu ter a calma soberana/
Que tens, em vez de agitação insana/
A sacudir meu peito de precito ...
Faze-me, pedra à tua semelhança:/
- Dá-me o sossego, a plácida confiança,/
Faze desta alma um bloco de granito!.
De todo o mal que o coração tortura,/
Tu, que tens a serena compostura/
De quem da vida a inquietação não sente,
Tu, que vives de todo indiferente/
Ao lodaçal desta charneca impura/
Que nós chamamos mundo, pedra escura/
Que eu te cobice a placidez consente!
Pudesse eu ter a calma soberana/
Que tens, em vez de agitação insana/
A sacudir meu peito de precito ...
Faze-me, pedra à tua semelhança:/
- Dá-me o sossego, a plácida confiança,/
Faze desta alma um bloco de granito!.
Leota e Luiz Dantas Quezado
O
escritor Florival Seraine, do Instituto Histórico do Ceará, afirma que nenhum
pesquisador de folclore no Brasil pode prescindir de consulta à obra de
Leonardo Mota: "Ele realizou trabalho de extrema importância para a
preservação da cultura popular. Realmente é impossível o desenvolvimento de
qualquer pesquisa sem antes verificar as contribuições de Leota sobre os
estudos nordestinos". O poeta Cláudio Martins, Presidente da Academia
Cearense de Letras, manifesta-se admirador de Leota:
-
Foi o homem mais vocacionado de todos os que se dão ao luxo do trabalho
intelectual no Pais. Leota desfez-se do seu cartório para fazer pesquisa no
plano da literatura natural, popular. Mesmo sendo ótimo poeta, preferiu
dedicar-se à divulgação dos mais importantes versos populares brasileiros.
Revelou ao Brasil a grandeza existente na poesia nordestina. Se não fosse seu
esforço, muito da cultura popular estaria hoje perdida.
Leonardo
Ferreira da Mota nasceu em Pedra Branca, em 10 de maio de 1891, filho de
Leonardo Ferreira da Mota e Maria Cristina da Silva Mota. Terminou os
preparatórios no Liceu do Ceará (1909), depois de Ter estudado em escolas
primarias de Quixadá, no Seminário de Fortaleza (1903) e no “Colégio São José”
na Serra do Estevão (1904 a 1908). Bacharel pela Faculdade de Direito do Rio de
janeiro, em 1916, foi redator de jornal "Correio do Ceará" e diretor
da "Gazeta Oficial". Foi notário público, tendo vendido o cartório
para, com o dinheiro, custear as suas excursões folclóricas. Conhecido pelo
pseudônimo de "Leota" assinava crônicas na imprensa cearense sobre os
mais variados assuntos. Em 1921, publicou um de seus mais importantes livros:
''Cantadores''.
Dedicado
totalmente ao folclore, reuniu depois suas pesquisas nos volumes
"Violeiros do Norte" (1925), "Sertão Alegre" (1928),
"No Tempo de Lampião" (1930), "Prosa Vadia" (1932) e
"A Padaria Espiritual" (1938). Pela relevância de sua obra, foi
eleito para a Academia Cearense de Letras e Instituto do Ceará. Considerado o
"príncipe dos folcloristas nacionais", faleceu em Fortaleza, em 2 de
janeiro de 1948.
No
dia da morte de Leonardo Mota, os originais do livro "Adagiário
Brasileiro” sumiram misteriosamente. Até hoje não se sabe de seu paradeiro.
Graças ao trabalho persistente de seus filhos Moacir e Orlando Mota, aquele
documento foi reconstituído numa tarefa que levou quinze anos, através de
manuscritos, rascunhos e recortes de jornais, Com seiscentas páginas,
"Adagiário" reúne dez mil ditados, locuções, modismos, ditos e
comparações matutas.
O
escritor Moreira Campos compartilha da opinião geral de que Leonardo Mota é o
nosso maior folclorista: "Sem dúvida que neste campo uma grande autoridade
do Nordeste e do Brasil, do ponto de vista da interpretação dos fenômenos
folclóricos, é a Câmara Cascudo. Mas ele não excedeu a Leonardo Mota no que
este pode recolher em relação sobretudo ao Nordeste". E acrescenta:
-
De resto, destaque-se a graça com que escrevia. A força com que sabia
transmitir os fatos. E isto está não só nos seus livros, como nas conferências
que pronunciou. Conferências aliciantes, pelo seu jeito de narrar, pelos
efeitos que tirava de sua exposição. Ele esqueceu todos os bens materiais para
perseguir seu objetivo que foi o folclore.
Otacílio
Colares, no livro "Lembrados e esquecidos" (Vol. 11), traça o perfil
de Leonardo Mota: "Ledor incansável, periodista de têmpera,
"causeur" inimitável, possuidor de extraordinária memória e de uma
"verve" somente igualável aos seus talentos expressionais, alcançou,
no Brasil, ao tempo em que seu nome começou a projetar- se, fora do Ceará, como
o de um dos mais dedicados soldados de pesquisa folclórica, à época,
justamente, do fastígio da conferência artístico-literária. A época em que, no
Sul, os escritores mais populares tinham na tribuna do conferencista
(conferente, como se dizia, então) o veículo, maior de sua popularidade".
Em
conferência proferida no antigo Clube Iracema, em Fortaleza, Leonardo Mota
falou sobre sua paixão "pela observação e estado dos costumes, da
linguagem e da poesia das nossas gentes do sertão". Interessado desde
menino pelo assunto, foi seduzido pela "vaidade de ser no nosso País, uni
arauto da inteligência do brasileiro nordestino". "Realmente,
Leonardo Mota mostrava toda a revolta contra a marginalização imposta aos
nordestinos, ao desrespeito por sua cultura e folclore. Em "Musa
Matuta", um dos capítulos do livro "Violeiros do Norte", revela
a postura assumida em sua peregrinação pelo Brasil:
-
Fui intransigente na defesa do sertão esquecido, do sertão ridicularizado, do
sertão caluniado e só lembrado quando dele se quer o imposto nos tempos de paz
ou o soldado nos tempos de guerra. E foi, sobretudo, contra o labéu de
cretinice do sertanejo nordestino que orientei a minha documentada contradita:
em todo o meu "Cantadores" e nas conferências que proferi, de Norte e
Sul, pus o melhor dos meus empenhos em fazer ressaltar a acuidade, a destreza
de espírito, a vivacidade da desaproveitada inteligência sertaneja, de que os
menestréis plebeus são a expressão bizarra e esquecida, apesar de digna de
estudos.
Em
todos as capitais que Leonardo Mota visitava, ouvia-se a sua voz contra o
preconceito existente em relação ao sertanejo: "Todo me devotei a uma
campanha de morigerado nacionalismo, refutando a velha injustiça de as
populações litorâneas ou citadinas só exergarem no sertanejo ou o cangaceiro
"de alma, de lama e de aço", a que se reporta Gustavo Barroso, ou o
ser desfibrado e lerdo que "magina de cócoras" e tão inexoravelmente
caricaturado por Monteiro Lobato. Protestei contra essa mania de
autodesmoralização que tristemente nos singulariza".
Existe
ainda outra característica de Leonardo Mota muito conhecida entre seus amigos:
a da improvisão de versos espontâneos, elaborados de forma jocosa, humorística.
Entre as dezenas de casos vividos pelo poeta, um dos mais conhecidos é sempre
contado nas rodas boêmias. A história se originou quando, em viagem pelo
interior, Leota recebeu um bilhete no hotel em que estava hospedado. O
proprietário, de nome "Maleta", pedia que ele "quitasse" a
divida de alguns dias de permanência. Em resposta, escreveu o seguinte bilhete:
-
"Meu caro amigo Maleta,
tenha pena do poeta.
Eu vejo a coisa tão preta
que não quero ser profeta.
Posso lá dizer-lhe a data
em que eu terei a dita
de pagar-lhe esta maldita
conta que tanto me mata.
Eu não sou homem de fita
e por isso evito a rata
de dizer-lhe a data exata
em que esta conta se quita
Veja bem a minha luta.
A paciência se esgota.
Que vida filha da p ...
Saudações, Leonardo Mota".
tenha pena do poeta.
Eu vejo a coisa tão preta
que não quero ser profeta.
Posso lá dizer-lhe a data
em que eu terei a dita
de pagar-lhe esta maldita
conta que tanto me mata.
Eu não sou homem de fita
e por isso evito a rata
de dizer-lhe a data exata
em que esta conta se quita
Veja bem a minha luta.
A paciência se esgota.
Que vida filha da p ...
Saudações, Leonardo Mota".
Fontes:
Leonardo Ferreira da Mota - Vithor.cjb.net; Enciclopédia
da Música Brasileira - Art Editora - Publifolha - 2a. Edição - 1998 - São
Paulo