No início do século XX o Pará teve intensa participação na publicação de folhetos de cordel através da GUAJARINA, editora de Francisco Lopes, na qual pontificou o poeta Firmino Teixeira do Amaral. Por sugestão do folclorista Vicente Salles, recém-falecido, a Feira Pan-Amazonica do Livro, realizada em Belém, abriu espaço para os cordelistas. Vejam a seguir, matéria publicada no jornal DIÁRIO DO PARÁ, cujo exemplar me chegou às mãos através do editor Gustavo Luz, de Mossoró, um dos entrevistados na matéria. Notem que alguns folhetos de minha autoria aparecem na foto que abre a matéria:
LINK:
http://www.diariodopara.com.br/N-168307-TRADICAO+E+PALAVRA+AFIADA.htm
Você – DIÁRIO DO
PARÁ, Sexta-feira, 3 de maio de 2013
Tradição e palavra afiada
Rima simples para ecoar tradições populares,
estórias que permeiam o imaginário de um país. A literatura de cordel,
conhecida expressão que surgiu no seio da região nordestina, começa na
oralidade para desembocar em folhetos bem humorados e singelos – uma
manifestação criativa e bem humorada do saber de um povo simples. O universo
lúdico construído por meio destas publicações tem espaço cativo na Feira
Pan-Amazônica do Livro. Amanhã, durante o dia, será realizado o III Encontro de
Cordelistas da Amazônia, com uma programação que conta com palestra, oficina e
uma feirinha de cordéis.
A literatura de cordel tem origem longínqua.
Considerada uma das formas literárias mais populares do Brasil, sua ideia base
vem da época do Renascimento, quando se popularizou o costume de produzir
publicações escritas na tentativa de eternizar relatos orais. “O cordel como
uma publicação é apenas o resultado físico de uma produção literária que é falada.
É uma literatura que é recitada, cantada, para depois ganhar o papel”, explica
Cláudio Cardoso, editor de cordéis e um dos organizadores do Encontro. E a
inspiração já atravessou o oceano pacífico batizada. Em Portugal, os folhetos
eram conhecidos como cordel, pois eram expostos para venda em cordas ou
barbantes. No nordeste brasileiro, a tradição do varal foi mantida, mas também
criou-se uma nova forma de escoamento: os populares livretos começaram ser
vendidos expostos em bancas, vendidos no famoso modo “corpo a corpo”.
Autores travam luta
contra o esquecimento
E no nordeste também se construiu uma estética
própria da manifestação, com temas e visual mais próximos da realidade
brasileira.Com a vinda dos nordestinos para a região amazônica no final do
século XIX - movimento ocasionado por causa dos ciclos da Borracha, do Peonato
(construção da Rodovia Transamazônica) e do Minério – o cordel veio na mala. Em
1914, um pernambucano monta a primeira editora de cordel da região, a
Guajarina, que ajuda na propulsão do trabalho dos cordelistas que já começaram
a despontar por essas bandas. De lá para cá, surgiram diversos cordelistas na
capital e nos municípios paraenses. Uma produção que resiste às dificuldades de
se fazer poesia popular, cheia de requintes artesanais.
Salve os cordelistas
da Amazônia
Este é o terceiro ano consecutivo que o Encontro de
Cordelistas da Amazônia é realizado, sempre dentro da Feira do Livro. A ideia
de promover um evento para saudar a classe artística local partiu do
pesquisador Vicente Salles. “Vicente era um dos maiores pesquisadores e
colecionadores de cordéis da região. Em uma conversa, ele nos deu essa ideia,
de criarmos uma ocasião para discutir e promover essa arte. Tinha que vir dele,
não é mesmo?”, conta Juraci Siqueira, cordelista que junto de João de Castro e
Cláudio Cardoso organiza o encontro.
Com o apoio da Secretaria de Cultura do Estado, o
grupo conseguiu fazer a primeira edição em 2011, que contou com a modesta
participação de 15 pessoas na plateia. No ano seguinte, o número de público
aumentou consideravelmente, para 150 participantes. “Com essa visibilidade
ficou provado que as pessoas têm interesse pelo assunto e assim a Secult nos
disponibilizou um espaço maior. Neste ano, a palestra do Encontro será na sala
Marajó, às 10h, e terá participação do professor e poeta Jesus Paes Loureiro e
do doutorando Hiran Possas, que pesquisa os cordéis amazônicos. Os
organizadores do encontro também participam do debate.
Esse crescente interesse do público e do próprio
Estado anima os cordelistas. Organizados em uma associação, o interesse deles é
que o cordel seja finalmente reconhecido como um instrumento didático de
ensino. “Há tempos a gente busca a inserção do cordel tanto como conteúdo
literário nas escolas, como ferramenta para o aprendizado. Nossa intenção não é
comercial, é mais de promover esse conhecimento popular, às vezes esquecido”,
argumenta Cláudio.
Um bom exemplo dessa luta está na participação do
potiguar Gustavo Luz. Ele é fundador da editora “Queima Bucho”, que publica
cordéis do Rio Grande do Norte, do Ceará e de outros estados do Nordeste.
“Montei a editora para publicações diversas, mas há cinco anos montei a coleção
só para cordéis. A gente sente que está acontecendo uma ‘revitalização’ dessa
expressão. Temos muitos cordelistas e as pessoas consomem os folhetos. A grande
dificuldade é mesmo a distribuição, daí a importância de feiras e encontros”,
esclarece Gustavo. A “Queima Bucho” participa do encontro com a exposição de
pelo menos 200 títulos diferentes.
João de Castro nasceu em Palmares, no Pernambuco,
mas já mora no Pará desde 1972. Conhecido por ser um cordelistas crítico – sua
última publicação foi “Belo Monte, o belo de destruir”, com escritos contrários
à construção da Hidrelétrica em Altamira -, João acredita que o ponto alto do
encontro são os contatos e ideias que surgem a partir dos papos. “Os
cordelistas trabalham vendendo de forma independente, se esforçam para produzir
e normalmente contam apenas com pequenas editoras. Então, numa situação como a
do encontro, podemos tanto conversar com outros como nós, como com o público
também. E isso só fortalece nossa rede”, diz.
Além da palestra, haverá também uma oficina de
cordel, com duas turmas, entre as 16h e 18h. Durante todo o dia, no estande do
Escritor Paraense, haverá a feira de cordéis. “Teremos aí pelo menos 300
títulos diferentes e estarão presentes em torno de 20 cordelistas – alguns de
Belém e outros de demais municípios. Vamos aproveitar a oportunidade para
discutir a realização da 1ª Feira de Cordel da Amazônia no segundo semestre
deste ano”, antecipa Cláudio.
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